Entrevista perdida de Raul Seixas deixa claro que ele foi maior do que Elvis

Entrevista perdida de Raul Seixas deixa claro que ele foi maior do que Elvis

As fontes pesquisadas não são unânimes, mas consta que Elvis Presley media cerca de 1,83 metros de altura, contra os prováveis 1,75 metros do baiano Raul Seixas. Portanto, em termos de estatura física, Elvis fora maior do que Raulzito. Contra números não restam argumentos, embora, eles não passem de ouro de tolo. Essa entrevista chistosa encontrada perdida e mal paga na tumba de um sábio faraó, retrata, única e exclusivamente, a grandeza artística e imaterial de Raul Seixas junto ao povo brasileiro, quando comparado ao icônico Elvis, o Rei do Rock, o maior do planeta desde o Big Bang.

A despeito da vigência da mediocridade na seara cultural contemporânea, com a ascensão meteórica de artistas ordinários de última hora, ilustres desconhecidos sem o devido escopo qualitativo que se espera deles, em especial nas redes sociais da internet infestadas pela escumalha de patéticos influenciadores digitais, qualquer pessoa minimamente insana, sensível e desequilibrada saberá dizer quem foi Raul Seixas e conhecerá, ao menos, uma de suas canções. Não há quem nunca tenha gritado “Toca Raul!” numa festa de casamento, formatura, batizado, velório e outros regabofes afins. No Brasil, Raul Seixas foi e continua sendo mais lembrado, mais amado e mais popular do que Elvis Presley. Daí a provocação, a esculhambação do título desse texto.  

Passados 36 anos desde a morte do Maluco Beleza, nada mais belo e maluco do que desencravar dessa tumba misteriosa uma entrevista atemporal concedida para um interlocutor desconhecido, um tal “Meu amigo Pedro”, que ninguém até o momento soube ao certo decifrar de quem se trata. Apesar de ter a vida ceifada pelo vício de uma droga letal socialmente aceita — Raul sucumbiu pelos males do alcoolismo — sobram sobriedade e perspicácia nas suas respostas. Curioso constatar que Raul respondeu aos questionamentos utilizando tão somente os títulos das suas canções mais conhecidas. Não sou o Ministério da Saúde, mas advirto: ao contrário da marvada pinga, apreciem Raul Seixas sem moderação. Vamos nos embriagar com a irreverência, o sarcasmo, o bom humor, a inteligência e, claro, as doses homeopáticas de sandice e os altos decibéis de boa música, cada vez mais rara de se ouvir atualmente. Viva Raul Seixas. Viva o rock. Viva a música popular brasileira e, claro, viva Elvis Presley, o Rei, o maior roqueiro de todos os tempos no planeta. 

Meu amigo Pedro — Vamos começar pela pergunta mais óbvia de todas. Quando nasceu Raul Seixas?

Raul Seixas — Eu nasci há dez mil anos atrás, no dia em que a terra parou.

Meu amigo Pedro — Como você veio parar na cidade do Rio de Janeiro?

Raul Seixas — Disco voador.

Meu amigo Pedro — Pare de zoar, Raulzito. Essa entrevista é coisa séria…

Raul Seixas — Trem das 7 e Metrô Linha 743.  

Meu amigo Pedro — O que você fazia antes de se juntar aos Panteras e se tornar um artista?

Raul Seixas — Como vovó já dizia: carimbador maluco, carpinteiro do universo, cowboy fora-da-lei.

Meu amigo Pedro — Não entendi.

Raul Seixas — Tente outra vez. Eu sou egoísta… (risos)

Meu amigo Pedro — Como funciona o seu processo de criação quando está compondo uma canção?

Raul Seixas — Aos trancos e barrancos. Óculos escuros. Movido a álcool. Um drink ou dois (risos).

Meu amigo Pedro — Como você se definiria como artista?

Raul Seixas — Eu sou o que sou. Um messias indeciso.

Meu amigo Pedro — Deus existe, Raul?

Raul Seixas — How could I know?

Meu amigo Pedro — Partindo do pressuposto de que Deus exista, o que você diria a ele, assim que entrasse no céu?

Raul Seixas — Tu és o MDC da minha vida, mas eu também vou reclamar: Todos os homens merecem o céu.

Meu amigo Pedro — Soa contraditório ouvir essas palavras de um roqueiro tão irreverente quanto você que vive falando coisas sobre o diabo.

Raul Seixas — Não quero mais andar na contramão. 

Meu amigo Pedro — Por que você e Paulo Coelho brigaram?

Raul Seixas — Eu não quero dizer nada. Eu realmente não preciso mais. Me deixa em paz.

Meu amigo Pedro — Tudo bem, Raul. O que você pensa sobre a atual política brasileira?

Raul Seixas — Trambique. Banquete de lixo. Muita estrela, pouca constelação.

Meu amigo Pedro — Se os fãs te elegessem Presidente do Brasil, qual seriam as suas primeiras palavras no discurso da posse?

Raul Seixas —S.O.S Aluga-se. (risos)

Meu amigo Pedro — Tem algo que te irrita mais do que a política?

Raul Seixas — Mosca na sopa, check-up, dentadura postiça e câimbra no pé. 

Meu amigo Pedro — O Brasil, que você já chamou de “A Ilha da Fantasia”, ainda tem jeito, Raul?

Raul Seixas — Não fosse o Cabral… (risos). Você ainda pode sonhar. Viva a sociedade alternativa!

Meu amigo Pedro — O que você sente quando a galera espalhada por todo o território nacional grita “Toca Raul! Toca Raul! Toca Raul!”?

Raul Seixas — Eu acho graça.

Meu amigo Pedro — Raul Seixas já conquistou tudo o que queria? Você tem mais alguma ambição na vida?

Raul Seixas — As minas do Rei Salomão (risos). Brincadeira…

Meu amigo Pedro — Quais são os seus projetos para o futuro, Raul?

Raul Seixas — Quero ser o homem que sou. Eu quero mesmo. Uma metamorfose ambulante. Só pra variar. Quando acabar, o maluco sou eu. Eu não tô nem aí. 

Meu amigo Pedro — Por quem os sinos dobram, Raul?

Raul Seixas — Al Capone.

Meu amigo Pedro — Você está trabalhando em algum projeto novo no momento?

Raul Seixas — Canto para minha morte.

Meu amigo Pedro — Você tem medo da morte, Raul?

Raul Seixas — Medo da chuva.

Meu amigo Pedro — Que tal uma mensagem final para os seus fãs?

Raul Seixas — Faça, fuce, force. Não pare na pista. Conserve seu medo. Se ainda existe amor, ainda queima a esperança. 

Eberth Vêncio

Eberth Franco Vêncio, médico e escritor, 59 anos. Escreve para a “Revista Bula” há 15 anos. Tem vários livros publicados, sendo o mais recente “Bipolar”, uma antologia de contos e crônicas.