O filme mais perturbador de 2025 — não é indicado para quem tem estômago fraco Divulgação / Causeway Films

O filme mais perturbador de 2025 — não é indicado para quem tem estômago fraco

Segundo longa-metragem dos irmãos australianos Danny e Michael Philippou, com roteiro de Danny e Bill Hinzman, “Traga Ela de Volta” mistura terror psicológico com horror ritualístico. Se você tem aversão a spoilers, pare por aqui, pois com certeza haverá alguns. Apesar disso, o filme é tão impactante que duvido que qualquer informação antecipada afete sua potência emocional.

O enredo gira em torno dos irmãos adolescentes Andy (Billy Barratt) e Piper (Sora Wong), que, embora não compartilhem o mesmo sangue — o pai dele se casou com a mãe dela —, têm um vínculo extremamente forte. O filme não deixa muitas coisas explícitas, assim como a morte da mãe de Piper, que não é justificada. Mas os irmãos Philippou sabem que os detalhes não importam tanto quanto a sensação provocada em cada cena. “Traga Ela de Volta” não é um terror que vai te fazer pular de susto, mas é como um pavio que queima lentamente até uma explosão aterrorizante de violência.

O primeiro ato, embora tenha momentos impactantes e grotescos, tem o objetivo de nos apresentar aos irmãos, mostrar a perda repentina do pai e a adoção deles por Laura (interpretada pela talentosa veterana Sally Hawkins). A morte de Phil (Steven Philips) é nebulosa. Somos brevemente informados de que ele sofria de câncer, mas morreu em um aparente choque elétrico no chuveiro, sendo encontrado já sem vida no chão do banheiro por Andy e Piper. Enquanto Piper tenta ressuscitá-lo, Andy entra em pânico. Ambos são afetados pelo luto, mas de maneiras distintas, algo que o filme explora ao longo da narrativa.

Os primeiros momentos na casa de Laura deixam claro seu desejo exclusivo por Piper. Andy é apenas um acompanhante indesejado, tratado com desprezo, especialmente por já ter um histórico de mau comportamento, relatado pela assistente social no momento em que os irmãos foram encaminhados para a adotante. Antes mesmo que o pai fosse velado, eles já haviam sido realocados à nova tutora.

É curioso que Piper seja hospedada no quarto de Cathy, filha falecida de Laura, que permanece com a mesma decoração de quando ainda era viva. Andy, por sua vez, é levado a uma espécie de sótão, dorme em um colchão velho e cercado por objetos rejeitados. Uma clara demonstração de que Piper é a predileta.

Na casa, Laura os apresenta a uma outra criança órfã, Oliver (Jonah Wren Phillips): um garoto misterioso, mudo, que passa a maior parte do tempo trancado em um quarto separado. Em uma cena, Andy diz a Oliver: “Fale comigo”, em referência ao filme anterior dos irmãos Philippou. 

A casa de Laura revela uma beleza antiga, agora em decadência, destruída pelo descuido e pela ausência de manutenção. A casa parece representar a própria Laura em seu declínio emocional e moral. Ela tenta se conectar com Oliver, após o velório de Phil, através do luto. Em uma conversa, compartilha a dor pela perda de Cathy e tenta, assim, ganhar a confiança do garoto. Laura claramente está emocionalmente destruída pela morte da filha e parece transferir para Piper o afeto perdido.

No segundo ato, as coisas se tornam mais bizarras. Laura começa a manipular Piper e a praticar gaslighting com Andy, fazendo-o acreditar que está enlouquecendo com a perda do pai e se tornando uma pessoa violenta. Ela diz a Piper que o irmão foi agressivo, e reforça isso revelando antigas agressões de Phil contra Andy, fazendo a garota acreditar que é motivo de ciúmes por sempre ter sido a favorita dos pais.

Enquanto isso, é revelado que Oliver faz parte de um ritual macabro, tendo sido feito hospedeiro de espíritos de pessoas mortas e uma ponte para que Laura transfira o espírito de Cathy para o corpo de Piper. A tentativa constante é afastar Andy, protetor leal da irmã, para que Laura possa concretizar seus planos através de um ritual russo satânico. No entanto, Laura realiza tudo sozinha, sem supervisão de qualquer liderança religiosa, tornando o processo atrapalhado e cheio de erros. Oliver frequentemente sai do controle de Laura, uma mãe que subverte o amor em obsessão.

É revelado que Laura trabalhava como assistente social, tendo acesso a crianças vulneráveis como Oliver. Andy e Piper provavelmente também já eram observados por ela, já que ela tem informações detalhadas sobre as agressões sofridas por Andy, seu comportamento errático e, principalmente, por ter conseguido levá-los tão rapidamente para sua casa. Fica subentendido que até mesmo a morte de Phil pode ter sido premeditada, algo que nunca nos é revelado plenamente.

Sobre o terceiro e último ato do filme, deixo em aberto, sem spoilers. No entanto, vale observar o uso simbólico da água nos processos de morte e renascimento dos personagens. Ela representa o fim, mas também o recomeço em “Traga Ela de Volta”. As fitas VHS que Laura assiste para emular os rituais de forma independente são símbolos do passado: algo que já se foi, mas ao qual ela permanece presa. Piper tem deficiência visual, e isso vai muito além de uma simples escolha de caracterização: sua protagonista tem uma visão distorcida de quem eram seus pais, seu irmão e até mesmo Laura. Ela não via as agressões sofridas por Andy e tampouco conhecia seu histórico de rebeldia. Também não percebe com facilidade as intenções de Laura. A falta de visão simboliza, assim, a ausência de percepção: o olhar ingênuo, frágil e moldado pela dor.

“Traga Ela de Volta” é pesado, cruel e não dá tréguas ao espectador. Apesar do visual grotesco, sua profundidade não é comprometida. Pelo contrário: entrega um filme perturbador e complexo, como todo bom terror deve ser.

Filme: Traga Ela de Volta
Diretor: Danny Phillipou e Michael Phillipou
Ano: 2025
Gênero: horror/Mistério/Terror Psicológico
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★
Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.