O Google penaliza conteúdo gerado por IA? Um estudo com 600 mil páginas diz que não

O Google penaliza conteúdo gerado por IA? Um estudo com 600 mil páginas diz que não

A ideia de que o Google penaliza conteúdos criados por inteligência artificial tornou-se quase um dogma em círculos de SEO e marketing digital. Entre tutoriais, fóruns e influenciadores do setor, a recomendação tem sido unânime: evite depender de IA para produzir seus textos, ou corra o risco de despencar nos rankings. Mas e se essa suposição estiver errada?

Um estudo recente da Ahrefs, plataforma de referência em análise de tráfego e SEO, propõe uma reavaliação desse paradigma. A partir da análise de 600 mil páginas web, os dados indicam que o Google não pune, tampouco premia automaticamente, conteúdos produzidos com auxílio de IA. A questão central não é quem escreve, mas o que se escreve — e para quem.

O medo da IA continua — mas os dados começam a falar mais alto

A pesquisa foi conduzida por Si Quan Ong e Xibeijia Guan, com revisão editorial de Ryan Law, e teve como ponto de partida uma pergunta objetiva: será que o uso de inteligência artificial afeta negativamente o ranqueamento das páginas?

Para responder com rigor, a equipe selecionou 100 mil palavras-chave aleatórias por meio da ferramenta Keywords Explorer, gerando uma amostra robusta de 600 mil URLs extraídas do banco de dados da Ahrefs.

Cada uma dessas páginas foi avaliada com o detector interno de conteúdo de IA. O sistema classificou os textos em três categorias principais: conteúdo 100% humano, conteúdo 100% gerado por IA, e conteúdo híbrido — este, dividido em quatro níveis, do uso mínimo ao dominante de inteligência artificial.

O retrato do conteúdo moderno: IA como coautora silenciosa

Os resultados revelam uma realidade que muitos já suspeitavam, mas poucos haviam quantificado: a presença da IA na produção de conteúdo já é amplamente disseminada. Das páginas analisadas, apenas 13,5% foram consideradas totalmente humanas. Em contrapartida, 86,5% apresentaram algum grau de participação da IA — desde correções gramaticais até a criação direta de parágrafos inteiros.

O dado mais instigante, porém, está no topo da pirâmide: 4,6% das páginas mais bem posicionadas nos resultados de busca foram geradas inteiramente por IA. Um número suficiente para desmontar, com evidência, a ideia de que há uma penalidade sistêmica em jogo. O padrão predominante é o da colaboração: a IA atua como ferramenta de apoio, não como autora autônoma.

IA não é critério de ranqueamento

A conclusão estatística do estudo é clara: a correlação entre o uso de inteligência artificial e a posição nos rankings do Google é de apenas 0,011 — ou seja, insignificante.

Esse número confirma que o algoritmo do Google não utiliza o uso de IA como fator de ranqueamento, seja para premiar ou punir. O foco continua sendo outro: a qualidade da informação, a utilidade para o usuário, a clareza na comunicação e a confiabilidade da fonte.

Ou, em outras palavras: o Google não quer saber se o texto foi escrito por um robô ou por uma pessoa — quer saber se vale a pena ser lido.

IA pura: ainda longe do primeiro lugar

Ainda assim, o estudo aponta nuances que não devem ser ignoradas. Entre os conteúdos que ocupam a primeira posição nos resultados, observa-se uma tendência: há menos presença de textos 100% gerados por IA.

Isso não contradiz os dados anteriores, mas os contextualiza. Embora a IA possa gerar textos que ranqueiam bem, a liderança absoluta ainda é ocupada por conteúdos com maior grau de curadoria humana.

Essa diferença parece refletir os princípios do E-E-A-T, adotados pelo Google como diretriz para avaliação de qualidade: experiência, especialização, autoridade e confiabilidade. São atributos que, até o momento, continuam sendo humanos — e difíceis de simular por completo com algoritmos.

Um novo paradigma editorial

A principal lição do estudo da Ahrefs não é sobre algoritmos, mas sobre autoria. Usar inteligência artificial na produção de conteúdo não é um erro. Confiar nela cegamente, talvez seja.

Ferramentas como ChatGPT, Gemini ou Claude são aliadas poderosas: ajudam a organizar ideias, propor títulos, revisar estilo, sugerir variações linguísticas. Mas a entrega de valor real ao leitor ainda exige julgamento editorial, repertório e senso crítico — qualidades humanas que não podem ser automatizadas.

Outro estudo da própria Ahrefs, com 879 profissionais de marketing, mostra que 87% já incorporam IA em seus processos criativos. Contudo, a maioria usa essas ferramentas como apoio, não como substituto integral do trabalho autoral.

Qualidade acima da autoria

No fim das contas, o algoritmo não se importa com a origem do conteúdo. O que importa é a experiência do leitor. Se um texto é útil, confiável, claro e bem estruturado, ele será valorizado — tenha sido escrito por uma pessoa, por uma IA, ou por ambos.

E, talvez, essa seja a maior mudança editorial dos últimos tempos. Porque, em um ecossistema digital saturado por textos, posts e automações, a pergunta que mais importa deixou de ser “isso foi feito por IA?”.

A pergunta certa agora é: “Esse conteúdo merece ser lido?”