4 livros que, após terminar, você terá vontade de voltar à primeira página

4 livros que, após terminar, você terá vontade de voltar à primeira página

É raro o livro que termina e deixa em seu lugar uma espécie de ausência. Não de história, ela se encerra, mas de presença. Como se algo ali tivesse respirado conosco, e agora faltasse ar. São romances que não se apagam com a última página, mas reverberam, subterrâneos, pedindo retorno. Não para entender o que escapou, mas para reencontrar aquilo que, estranhamente, ficou.

“Nostalgia”, de Cărtărescu, talvez seja o exemplo mais íntimo dessa vertigem. Lê-se como quem atravessa corredores oníricos, onde o tempo desmancha e a infância é um espelho deformado do futuro. Há um menino que move objetos com a mente, há um arquiteto de destinos, há Bucareste, mas nada é exatamente o que parece. As imagens se embaralham como sonhos mal acordados. Ao fim, a única certeza é a de que o livro nos leu antes de ser lido. E que não basta uma vez.

Em “Sátántangó”, de Krasznahorkai, o movimento do retorno é literal e simbólico. A vila soterrada em lama parece presa numa repetição hipnótica. O falso messias chega e, com ele, o vórtice. Cada frase se arrasta como uma procissão sem fim, e o tempo escorre, viscoso. O fim reencontra o começo. Reabrir o livro é quase inevitável, não para escapar, mas para afundar mais fundo.

Com “Meridiano de Sangue”, McCarthy abandona qualquer ternura. O deserto, aqui, é escritura e abismo. O garoto sem nome atravessa paisagens bíblicas onde a morte é rito e o juiz Holden dança no limiar do humano. Não há enredo que salve, não há salvação que se ofereça. E, mesmo assim, há beleza. Há uma linguagem que sangra. Terminá-lo e não recomeçar seria uma forma de traição.

E então, “Os Irmãos Sisters”. O faroeste torcido de Patrick deWitt guarda um coração delicado sob a poeira e as balas. Eli Sisters, cansado de matar, começa a notar o peso do silêncio. O humor seco, quase melancólico, nos embala até que o livro acabe, e aí queremos voltar. Não por violência, mas por ternura. Uma ternura que chegou tarde, mas ainda pulsa.

Carlos Willian Leite

Jornalista especializado em jornalismo cultural e enojornalismo, com foco na análise técnica de vinhos e na cobertura do mercado editorial e audiovisual, especialmente plataformas de streaming. É sócio da Eureka Comunicação, agência de gestão de crises e planejamento estratégico em redes sociais, e fundador da Bula Livros, dedicada à publicação de obras literárias contemporâneas e clássicas.