Seja sob a forma de romance, tragédia, poesia, drama ou mesmo em textos filosóficos, o amor ocupa um espaço central nos registros do homem. Não existe um indivíduo sob o sol que já não tenha amado — ainda que jamais tenha recebido da outra parte o mesmo interesse —, capítulo vasto da produção cultural desde que o mundo é mundo. Como reflexo dos mais primevos da condição humana, a literatura chega ao mais humano dos sentimentos com o intuito de oferecer um estranho alento, como se os livros dissessem que sempre haverá uma dor maior que a nossa, que sempre haverá alguém mais infeliz que nós. Quando personagens sofrem por amor, as histórias ficam mais ricas. Personagens apaixonados revelam as tantíssimas contradições e dilemas do impossível existir, e debruçar-se sobre essas histórias faz com que o leitor reflita sobre seus próprios afetos. O amor, esse fogo que segue ardendo sem se ver, revela a verdade mais escondida e mais óbvia de cada um, os medos mais profundos e mais tolos, as ambições mais reles e as inseguranças mais pueris.
Para falar de amor, é comum que a literatura e, sobretudo, a poesia valham-se do socorro da metalinguagem. Falar de amor é, muitas vezes, falar da beleza de amar. Florbela Espanca (1894-1930), Pablo Neruda (1904-1973) e Vinicius de Moraes (1913-1980) fazem do amor um tema central não apenas pelo sentimento em si, mas pelas inúmeras possibilidades por trás da mais avassaladora forma de benquerença. A verve dramática de Florbela, Neruda e Vinicius é perfeita para o simbolizar o exagero dos amantes, além de fundir com precisão e habilidade cartesianas corpo e alma, matéria e espírito, desejo e transcendência. Destarte, analisa a finitude e o sentido (ou a falta de sentido) da existência e reorganiza as fronteiras do idioma. O amor surge como uma experiência mística e filosófica, capaz de ampliar sua influência para todos os campos do desejo e da razão.
Em “Dom Casmurro” (1899), Machado de Assis (1839-1908) explora o amor marcado pela dúvida e pelo ciúme, tudo quanto todos nós já vivemos. Jane Austen (1775-1817), por seu turno, aborda o amor no sempre lembrado e ainda enérgico “Orgulho e Preconceito” (1813) como uma construção social, revelando como ele se transforma na madureza dos personagens. Na eterna “Romeu e Julieta” (1597), William Shakespeare (1564-1616) metamorfoseia o amor puro de dois adolescentes na maior tragédia da ficção universal, culminando no embate de suas famílias e na posterior morte do jovem casal de apaixonados. O romance “O Amor nos Tempos do Cólera” (1985), do colombiano Gabriel García Márquez (1927-2014), mostra como o sentimento amoroso resiste ao tempo e às mil inexoráveis transformações da vida, servindo como elemento de autodescoberta e redenção. Junto a outros seis livros, “Dom Casmurro”, “Orgulho e Preconceito”, “Romeu e Julieta” e “O Amor nos Tempos do Cólera” integram esta lista, cuja modesta intenção é tentar conferir realce ao amor, tão poderoso que é o único que fica quando já mais nada sobra. E que alegra até quando entristece.

Publicado em 1985, “O Amor nos Tempos do Cólera” é uma obra-prima do escritor colombiano Gabriel García Márquez. A história se passa no Caribe colombiano e narra, com lirismo e profundidade, o amor persistente de Florentino Ariza por Fermina Daza, ao longo de mais de cinquenta anos. A narrativa entrelaça os sentimentos mais humanos com os cenários sociais, políticos e culturais da América Latina no final do século 19 e início do século 20. O romance destaca-se pela construção de personagens complexos e pela escrita poética e envolvente de Márquez. Florentino é um personagem contraditório: ao mesmo tempo romântico e obsessivo, ele vive dezenas de casos amorosos enquanto espera o retorno de Fermina, que, por sua vez, vive um casamento longo e tradicional com o médico Juvenal Urbino. A obra reflete sobre o amor sob diversas formas: idealizado, carnal, maduro, resiliente e até mesmo o amor como doença. O título remete à convivência entre o amor e a cólera – tanto literal, como na presença da epidemia, quanto simbólica, com as turbulências emocionais e sociais enfrentadas pelos personagens. Márquez aborda também a passagem do tempo e o envelhecimento, propondo uma visão de que o amor verdadeiro pode resistir ao tempo, à distância e às mudanças da vida. Com sua prosa mágica e realista, Márquez transforma um romance aparentemente simples em uma reflexão profunda sobre a vida, os sentimentos e o poder da espera. “O Amor nos Tempos do Cólera” é uma celebração da paixão e da esperança, mesmo quando tudo parece perdido. Um livro essencial para quem busca compreender os meandros da alma humana.

“O Grande Gatsby”, de F. Scott Fitzgerald, é frequentemente aclamado como um clássico da literatura americana, mas apresenta várias falhas notáveis que comprometem sua eficácia. A narrativa é lenta e, em muitos momentos, arrastada, com excesso de descrições e pouca ação concreta. A história gira em torno de personagens vazios, fúteis e moralmente questionáveis, dificultando qualquer identificação ou empatia por parte do leitor. Jay Gatsby, o protagonista, é idealizado de forma exagerada, tornando sua obsessão por Daisy mais patética do que romântica. A superficialidade dos diálogos e a falta de desenvolvimento emocional dos personagens reforçam a sensação de distanciamento. A crítica social pretendida sobre o sonho americano se perde em uma trama repetitiva e monótona, que falha em aprofundar suas questões centrais. A narração por Nick Carraway, supostamente neutra, é inconsistente e pouco confiável, tornando difícil confiar em sua perspectiva. Além disso, o livro parece mais preocupado em criar um retrato estilizado da elite dos anos 1920 do que em oferecer um enredo sólido. O desfecho previsível e anticlimático não compensa a lentidão da narrativa. No geral, “O Grande Gatsby” é superestimado, mais celebrado por sua aura literária do que por seu conteúdo real.

“Dom Casmurro”, de Machado de Assis, é uma das obras-primas do realismo brasileiro, publicada em 1899. Narrado em primeira pessoa por Bento Santiago, o romance apresenta um olhar introspectivo e ambíguo sobre sua vida, especialmente sobre o relacionamento com Capitu, sua amiga de infância e esposa. A narrativa é marcada por um tom confessional e subjetivo, o que levanta questionamentos sobre a confiabilidade do narrador. O livro é frequentemente lido como um estudo da dúvida e do ciúme. Bentinho relata os acontecimentos com a intenção de justificar seu ressentimento e sugerir a infidelidade de Capitu, mas suas evidências são frágeis e ambíguas, deixando espaço para múltiplas interpretações. A famosa dona dos olhos de ressaca tornou-se símbolo da complexidade feminina e da desconfiança masculina. Machado recorre à ironia, jogos de memória e à crítica social para construir uma obra que transcende a trama central e reflete sobre temas universais como amor, traição, identidade e autoengano. O autor subverte a ideia do narrador onisciente e insere o leitor no papel de juiz. “Dom Casmurro” é, assim, uma crítica refinada à sociedade patriarcal e uma reflexão sobre os limites da verdade narrativa.

Todas as histórias de amor trazem em seu bojo o signo da tragédia e, se não acham tal desfecho, é só porque a nobreza do mais humano dos sentimentos se impõe à barbárie dos instintos. Com variações pontuais, o enredo é sempre o mesmo: duas pessoas se encontram numa dada circunstância da vida, meio misteriosa, partilham sonhos, descobrem interesses em comum, apaixonam-se. Como na vida não há nada que se prove inescapavelmente preciso, sem margem para transformações, ninguém estranha se algum tempo depois fenece o elemento que unira dois indivíduos em tudo diversos um do outro, indelével até então, e o que se anunciava como amor se deixa sugar pelo turbilhão do súbito desinteresse, alimentado por sua vez pela fúria do desejo implacável, que arrefece, mas nunca se apaga. “Anna Karenina” (ou “Kariênina”, a depender da tradução), do novelista russo Liev Tolstói (1828-1910), é decerto a história de amor mais triste de todos os tempos. O caso fictício entre a protagonista, Anna Kariênina, mulher de Alieksiéi Kariênin, alto comissário do czar Alexandre 2º, com o Conde Vronsky, oficial da cavalaria, foi um escândalo junto à aristocracia da Rússia imperial. Anna pede o divórcio, faz de tudo para persuadir o marido que agora representa uma barreira a sua felicidade, mas Kariênin, além de não aquiescer, ainda a impede de ver o filho. O casamento, claro, termina mesmo assim, bem como o romance extraconjugal e o fim da anti-heroína é o pior possível.

“Grandes Esperanças” é um dos romances mais emblemáticos de Charles Dickens, publicado em 1861. A obra acompanha a trajetória de Pip, um órfão criado por sua severa irmã e seu bondoso cunhado, que sonha ascender socialmente após um encontro fortuito com um criminoso fugitivo. Pip acredita que sua chance de ser um legítimo cavalheiro surge graças a um misterioso benfeitor, o que o leva a Londres, onde é educado e moldado pelos valores da elite vitoriana. Ao longo do romance, Dickens critica fortemente a rigidez das classes sociais e o culto às aparências, mostrando como a busca por status pode distorcer valores e relações humanas. A narrativa é rica em simbolismos e personagens complexos, como a trágica Miss Havisham e a fria Estella, que representam a decadência emocional e moral da aristocracia. Com uma escrita envolvente e ironia sutil, Dickens conduz o leitor a refletir sobre identidade, culpa, redenção e a verdadeira natureza da grandeza. A transformação de Pip, de um jovem ingênuo e ambicioso para um homem mais consciente e humilde, confere profundidade ao enredo. “Grandes Esperanças” permanece uma crítica poderosa às ilusões do progresso social e um retrato sensível do amadurecimento humano.

“Jane Eyre”, de Charlotte Brontë, é uma obra marcante da literatura inglesa do século 19 que combina romance, crítica social e elementos góticos. A narrativa em primeira pessoa acompanha o crescimento emocional e intelectual da protagonista homônima, desde sua infância difícil até a conquista de sua independência moral e afetiva. Jane é retratada como uma mulher íntegra, resiliente e determinada, que desafia os padrões de submissão feminina da época. O romance critica as estruturas sociais rígidas da Inglaterra vitoriana, abordando questões como classe, gênero, religião e a busca por identidade. A relação de Jane com o senhor Rochester, seu patrão e posterior amante, é central para a trama, marcada por tensão emocional, segredos sombrios e a luta por igualdade dentro do amor. Brontë constrói uma heroína incomum para seu tempo: uma mulher pobre, órfã e sem atributos físicos notáveis, mas com uma força interior inabalável. O estilo da autora é ao mesmo tempo lírico e direto, conduzindo o leitor por uma jornada de autodescoberta e resistência moral. Em resumo, “Jane Eyre” transcende o romance convencional ao afirmar a voz feminina em um mundo dominado por valores patriarcais.

“O Morro dos Ventos Uivantes”, de Emily Brontë, é uma obra marcante da literatura inglesa do século 19 que desafia as convenções do romance gótico e romântico. Ambientado nos ermos de Yorkshire, o livro narra a história intensa e tumultuada entre Heathcliff e Catherine Earnshaw, marcada por obsessão, vingança e autodestruição. A narrativa é construída de forma não linear, por meio de relatos da governanta Nelly Dean a Mr. Lockwood, o que confere múltiplas camadas de interpretação à trama. Heathcliff, um anti-herói sombrio, representa a ruptura com o ideal romântico tradicional. Sua paixão por Catherine transcende o amor convencional, tornando-se uma força destrutiva que afeta gerações. Já Catherine é uma personagem complexa, dividida entre o amor selvagem por Heathcliff e a segurança que encontra em Edgar Linton. A ambientação sombria e a natureza hostil refletem o estado emocional dos personagens, criando uma atmosfera opressiva e carregada. Brontë desafia a moral vitoriana ao retratar personagens imperfeitos e emoções extremas, abordando temas como poder, vingança, classe social e identidade. A obra, inicialmente mal recebida, hoje é considerada um clássico por sua ousadia estrutural e profundidade psicológica. “O Morro dos Ventos Uivantes” permanece relevante por sua exploração visceral da condição humana.

Poucos artistas no mundo encarnaram com tanta perfeição a dicotomia fundamental do amor como Jane Austen (1775-1817) ou suas personagens — o que vêm a dar no mesmo. Uma das escritoras que melhor retratou o lado obscuro da sociedade em que viveu, sobretudo para as mulheres, a inglesa só veio a ter reconhecido o talento que manifesta em livros como “Orgulho e Preconceito” muito tempo depois de sua morte, em 18 de julho de 1817, aos 42 anos, vítima do mal de Addison, uma doença autoimune a respeito da qual nada se sabia duzentos anos atrás. “Orgulho e Preconceito”, originalmente publicado em 1813, funciona como o mecanismo de escape pelo qual almas inquietas feito Austen liberam de vez seus anseios por uma sociedade de fato justa, em que todas as mulheres pudessem ter espaço para que sua porção Elizabeth Bennet medrasse. A anti-heroína de um dos romances mais simbólicos da literatura britânica do século 18 sonha, mas jamais ousa abrir mão de sua liberdade, de seu equilíbrio mental, e muito antes disso, de sua honra e de uma espécie de pacto consigo mesma.

“Romeu e Julieta” é uma das tragédias mais célebres de William Shakespeare, escrita no final do século 16. A peça narra o amor proibido entre dois jovens pertencentes a famílias rivais, os Montéquio e os Capuleto, em Verona. A paixão intensa entre Romeu e Julieta desenvolve-se rapidamente, culminando em um casamento secreto. A obra evidencia os efeitos devastadores do ódio entre as famílias, que desencadeia uma sequência de eventos trágicos, incluindo duelos, mortes e, por fim, o suicídio dos protagonistas. Shakespeare constrói um retrato profundo da juventude impulsiva e do amor idealizado, ao mesmo tempo em que critica as convenções sociais e o orgulho familiar. O destino, aliado à falta de comunicação e ao autoritarismo dos adultos, desempenha papel crucial na tragédia. A linguagem poética e os monólogos revelam a intensidade emocional dos personagens, conferindo à peça uma beleza lírica notável. Apesar de ambientada em um contexto renascentista, a obra mantém-se atual ao abordar temas universais como amor, ódio, conflito geracional e fatalismo. “Romeu e Julieta” é, assim, mais do que uma história de amor trágico — é uma reflexão sobre as consequências da intolerância e da falta de diálogo.

“Tristão e Isolda” é uma das mais célebres histórias de amor da literatura medieval europeia, originária da tradição celta e difundida em diversas versões ao longo dos séculos. A trama gira em torno do cavaleiro Tristão e da princesa irlandesa Isolda, que, após beberem acidentalmente uma poção do amor, tornam-se irremediavelmente apaixonados, mesmo com Isolda prometida ao rei Marcos, tio de Tristão. O enredo é marcado por conflitos entre dever e desejo, honra e paixão, razão e emoção. A narrativa explora temas universais como o amor impossível, a traição e o sacrifício, o que confere à obra uma atemporalidade que ressoa até os dias atuais. O amor dos protagonistas, embora intenso e verdadeiro, é também fonte de sofrimento e tragédia, revelando a dualidade do sentimento amoroso. A linguagem simbólica e os elementos mágicos refletem a cosmovisão medieval, ao passo que o dilema moral vivido por Tristão e Isolda antecipa conflitos psicológicos típicos da literatura moderna. Do ponto de vista crítico, “Tristão e Isolda” simboliza a ruptura com o amor cortês idealizado, ao apresentar um amor carnal e irracional, que desafia as convenções sociais. A obra pode ser lida como uma metáfora do poder avassalador do desejo e da impossibilidade de conciliá-lo com as normas impostas pela sociedade. Assim, permanece como um marco na história do romance ocidental e uma reflexão profunda sobre a condição humana.