Como ler uma cicatriz? — 4 narrativas sobre dor, cura e recomeço

Como ler uma cicatriz? — 4 narrativas sobre dor, cura e recomeço

É difícil nomear o que não se fecha. Há dores que continuam ali, mesmo depois que o corpo se recompõe. A pele, sabemos, mente bem. Ela cobre, disfarça, mascara o que dentro ainda se movimenta com a mesma urgência do primeiro impacto. E é por isso que certas histórias não curam — apenas voltam. Não por escolha, mas porque permanecer é o único modo possível de dizer “ainda estou aqui”.

A cicatriz, essa marca persistente, não é apenas um vestígio. É uma forma de linguagem. Não grita, mas se impõe. Às vezes arde sem motivo. Às vezes sussurra quando o mundo está calado. E há livros que são exatamente isso: cicatrizes escritas. Não para embelezar a dor — isso seria trair a matéria —, mas para não permitir que ela se apague sem testemunho.

Nestes relatos, não há metáforas confortáveis, nem resoluções didáticas. O que se encontra é o desconforto do vivido exposto em primeira pessoa. Um trauma infantil narrado sem piedade nem exagero. Um corpo feminino invadido e reescrito em silêncio. A tentativa, quase impossível, de amar um pai que nunca soube como ser. O vínculo feroz entre mãe e filha, tão inquebrável quanto insuportável. São vozes que não se erguem para convencer, mas para resistir.

É preciso disposição para ouvir o que não quer ser dito. Para ler o que ainda sangra. Porque há dor que se organiza em palavras não para ser entendida, mas para que o outro — talvez nós — possa carregá-la junto, por um instante que seja. E se há algo de cura nisso, ela é parcial, frágil, intransitiva.

Essas narrativas não respondem à pergunta do título. E nem deveriam. O que elas fazem é outra coisa: transformam a cicatriz em traço, em ritmo, em voz. E, ao fazerem isso, abrem espaço para que a dor não seja apenas o que nos aconteceu — mas também o que escolhemos lembrar. Não para curar. Mas para continuar.