10 livros que todo mundo finge que ama, mas secretamente achou insuportáveis

10 livros que todo mundo finge que ama, mas secretamente achou insuportáveis

A literatura, como qualquer manifestação artística, está sujeita a modas, convenções e expectativas, e frequentemente certos livros tornam-se ícones quase inquestionáveis do “bom gosto literário”. Basta uma menção ainda que despretensiosa a autores como James Joyce (1882-1941) ou Jean-Paul Sartre (1905-1980) para que muitos logo demonstrem sua reverência, mesmo sem jamais terem ultrapassado as primeiras páginas de seus livros mais célebres. Surge então uma pergunta incômoda, porém necessária: por que há livros que todo mundo finge que ama, mas que, na verdade, acha incômodos, tediosos, impenetráveis, intangíveis? A resposta envolve uma complexa rede de fatores, sociais, psicológicos e históricos. Em primeiro lugar, há a coerção cultural. Do jardim de infância aos bancos da universidade, alguns livros são apresentados não como obras que podem ser lidas por prazer ou curiosidade intelectual, mas como uma passagem estreita para o éden dos inteligentes e eruditos. Quem não os leu, pode ser visto como menos culto, menos sofisticado, menos preparado para vencer os implacáveis desafios da vida como ela é. Afetar intimidade com eles torna-se, assim, um mecanismo de sobrevivência social.

Ninguém está disposto a abrir mão de seu capital cultural — e aqueles que não o tem fingem tê-lo, apenas. Este conceito, elaborado pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu (1930-2002), respeita à acumulação não só de bens materiais como também de conhecimento, linguagem e gostos que conferem prestígio. Dizer que “Finnegans Wake” (1939) é uma obra-prima da literatura universal embora não se tenha a mais pálida ideia acerca do argumento central do romance de Joyce ou de suas intenções para além da diegese, ou que a existencialista condenação à liberdade de “A Náusea” (1938) de Sartre significa ter todo o direito de fazer o que bem desejar são sintomas óbvios do mau uso e das distorções do capital cultural, cenário mais e mais corriqueiro num mundo intolerante de pessoas rasas em que vale a aparência e no qual lacunas na educação formal podem ser compensadas com joias, roupas de grife, carros importados, mansões faraônicas. Não há debate porque todos sabem tudo, e, assim, confessar ignorância sobre certo tema é imolar-se em praça pública.

Joyce e Sartre são apenas dois exemplos de escritores tachados de difíceis, herméticos, insuportáveis, muita vez sem razão. De qualquer forma, “Finnegans Wake” e “A Náusea” juntam-se a mais oito livros nessa lista, pensada para dissipar a bruma de obscurantismo e até repulsa que sempre pairou sobre seus nomes. Não é nenhum crime o leitor achá-los intragáveis, claro, desde que munido de informação e algum embasamento teórico. O bom jornalismo presta-se a isso também. 

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.