E se personagens literários usassem o Tinder? Perfis, matches e flertes de 50 clássicos da ficção

E se personagens literários usassem o Tinder? Perfis, matches e flertes de 50 clássicos da ficção

A literatura sempre foi um palco para o imprevisto, o desencontro, o desejo escondido nas entrelinhas, nas cartas nunca enviadas, nos olhares furtivos entre páginas amarelecidas pelo tempo. E se, num salto de imaginação, esses personagens escapassem do papel e aterrissassem num território onde tudo se resolve — ou se desmancha — com um movimento de polegar? No Tinder, a eternidade das paixões ganha cronômetro, a profundidade cede espaço à superfície, e mesmo o mais trágico dos amantes precisa decidir em segundos se entrega ou não seu segredo a um desconhecido. Imagino o nervosismo de Mr. Darcy, oscilando entre o orgulho e a tentação de escrever uma bio espirituosa. Ou Capitu, a olhar de lado, provocando com meia frase enigmática, enquanto Heathcliff, debruçado sobre o abismo do próprio ciúme, hesita antes de deslizar para a direita. Há algo de vertigem nesse encontro improvável entre universos: o romanesco e o digital. Nem todos os corações aguentam o espelho impiedoso da autoimagem — quem nunca travou diante do campo “sobre mim”, que atire o primeiro perfil falso.

Há quem busque redenção; outros, só distração. Hamlet hesita, mas Medeia não — seria ela banida em minutos, bloqueada antes de terminar a primeira frase? O algoritmo, esse novo oráculo, pouco se importa com os tormentos existenciais de Dostoiévski ou as delicadezas de Jane Austen. O que importa, afinal, é se o sorriso convence, se a foto parece sincera, se há promessas de aventuras ou feridas mal cicatrizadas. Não há espaço para a espera de Florentino Ariza, tampouco para o idealismo de Emma — e, no entanto, todos, de algum modo, ali estão, entregues a essa loteria do encontro instantâneo, onde a literatura vira jogo e o jogo, teatro.

Talvez o grande mistério não seja mais o desenlace do romance, mas a possibilidade — terrivelmente moderna — de não haver sequer começo. Ainda assim, é tentador imaginar quem daria match com quem, quem sairia para um café e quem silenciaria no segundo “oi”. Porque, entre um swipe e outro, aquilo que nos faz humanos — a dúvida, o desejo, o medo do ridículo — continua, inalterado, à espera de um improvável par.


Hamlet (Hamlet, de William Shakespeare)

Príncipe da dúvida, com agenda cheia de solilóquios e zero paciência para certezas. Aceite o match se você conversa com caveiras — ou se prefere questionar o match do que consumá-lo.


Dom Quixote (Dom Quixote, de Miguel de Cervantes)

Campeão mundial de ilusões e batalhas perdidas. Me escolha se você confunde realidade com poesia — e nunca reclamou de vento forte no rosto.


Sherlock Holmes (As Aventuras de Sherlock Holmes, de Arthur Conan Doyle)

Detetive consultor, mente inquieta, um leve vício em enigmas e outro em sarcasmo. Dê um match se não tem medo de ser analisado até os ossos (ou a alma).


Emma Bovary (Madame Bovary, de Gustave Flaubert)

Especialista em drama e sonhos parisienses. Busco alguém que saiba fugir da rotina — mas que me traga de volta a tempo do próximo capítulo.


Raskólnikov (Crime e Castigo, de Fiódor Dostoiévski)

Pensador de travesseiro, praticante do arrependimento precoce. Entre se você consegue segurar um dilema moral sem deixar cair.


Anna Kariênina (Anna Kariênina, de Liev Tolstói)

Tragédias ferroviárias, paixões sem freio. Aceite o match se você não se importa de perder o último trem — nem o juízo.


Jay Gatsby (O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald)

Anfitrião das melhores festas e das piores saudades. Entre se você dança bem sob luzes verdes e sabe guardar segredos do verão passado.


Gregor Samsa (A Metamorfose, de Franz Kafka)

Desperto de manhã, nunca sei em que corpo estou. Se você encara transformações (ou só acha insetos simpáticos), puxe conversa.


Elizabeth Bennet (Orgulho e Preconceito, de Jane Austen)

Ironia é meu idioma, orgulho é só estilo. Me escolha se você dança com a inteligência — e nunca se atrapalhou num baile.


Capitão Ahab (Moby Dick, de Herman Melville)

Obstinado, só tenho olhos para baleias brancas — e problemas do tamanho do mar. Aceite o match se curte obsessão náutica e perdoa monomanias.


Huckleberry Finn (As Aventuras de Huckleberry Finn, de Mark Twain)

Fugindo de regras desde 1884. Dê um match se você prefere rio à rotina e consegue rir de lama nos sapatos.


Capitão Nemo (Vinte Mil Léguas Submarinas, de Jules Verne)

Solitude subaquática, barco próprio e colecionador de peixes exóticos. Me escolha se o silêncio do fundo do mar te atrai mais que qualquer multidão.


Jean Valjean (Os Miseráveis, de Victor Hugo)

Braços fortes e alma penada, já fui condenado e absolvido. Aceite o match se você acredita em redenção — ou só precisa de ajuda com o pão nosso.


Macbeth (Macbeth, de William Shakespeare)

Visões noturnas, ambições matinais. Se você não teme profecias e não se incomoda com fantasmas de terceira, venha reinar comigo (até segunda ordem).


Dom Casmurro (Dom Casmurro, de Machado de Assis)

Exímio guardador de dúvidas. Me escolha se você já se perdeu entre versões, mas jura que não tem nada a esconder.


Capitu (Dom Casmurro, de Machado de Assis)

Olhos de ressaca, sumo fácil do chat e volto quando ninguém espera. Aceite o match se você topa mistérios — e promete não contar para o Bentinho.


Alice (Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll)

Chá das cinco, conversas com coelhos e mapas que só mostram o que já não existe. Me dê um match se você prefere a dúvida à resposta.


Jane Eyre (Jane Eyre, de Charlotte Brontë)

Amor-próprio na bagagem, coração à prova de incêndios. Entre se você suporta tempestades, segredos em sótãos e romances góticos.


Robinson Crusoé (Robinson Crusoé, de Daniel Defoe)

Trabalho bem sozinho, mas companhia salva feriados. Aceite o match se topar aventuras em ilha deserta — ou só quiser dividir coco.


Ulisses/Odisseu (Odisseia, de Homero)

Especialista em chegar atrasado, mas com ótimas histórias de viagem. Me escolha se saudade não te assusta — e o importante é sempre voltar.


Dante (A Divina Comédia, de Dante Alighieri)

Percorri todos os círculos só para escrever poesia. Dê um match se você acredita que, depois do inferno, só resta amar melhor.


Drácula (Drácula, de Bram Stoker)

Romântico noturno, aprecio vinho tinto e não exijo luz solar. Aceite o match se não liga para caninos ou para eternidades inquietas.


Fausto (Fausto, de Goethe)

Troquei alma por experiência, mas sobrou espaço para alguém. Me escolha se pactos não te assustam — e curte conversa com sábios e demônios.


Dorian Gray (O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde)

Beleza eterna, espírito inquieto. Dê um match se gosta de elogios, mas promete não abrir portas trancadas.


Ebenezer Scrooge (Um Conto de Natal, de Charles Dickens)

Economizo palavras e abraços, mas aceito milagres natalinos. Entre se o seu espírito é festivo — ou sua conta bancária saudável.


Tom Sawyer (As Aventuras de Tom Sawyer, de Mark Twain)

Colecionador de travessuras, campeão em cercas pintadas por terceiros. Aceite o match se infância ainda faz parte do seu repertório.


Heathcliff (O Morro dos Ventos Uivantes, de Emily Brontë)

Amor de vendaval, ressentimento de tempestade. Me escolha se você topa paixões com previsão de chuva forte.


Holden Caulfield (O Apanhador no Campo de Centeio, de J.D. Salinger)

Detector de falsidade, apreciador de museus e conversas sem fim. Dê um match se autenticidade for seu sobrenome.


Winston Smith (1984, de George Orwell)

Gosto de rebeldias discretas e sonhar com liberdade. Aceite o match se você também não suporta olhos que tudo veem.


Lolita/Dolores Haze (Lolita, de Vladimir Nabokov)

Quero crescer sem rótulos, brincar de enigmas e perder a hora do recreio. Me escolha se maturidade é só uma questão de tempo.


Pip (Grandes Esperanças, de Charles Dickens)

Sonhador com experiência em tropeços. Entre se você acredita em recomeços, mesmo quando o fim parece melhor.


Orlando (Orlando, de Virginia Woolf)

Mudo de século, de gênero e de gosto literário — tudo ao mesmo tempo. Dê um match se não tem medo do imprevisível.


Quasímodo (O Corcunda de Notre-Dame, de Victor Hugo)

Torres, sinos e uma visão nada comum sobre beleza. Aceite o match se a altura não te dá vertigem.


Sancho Pança (Dom Quixote, de Cervantes)

Pragmático, bom de papo e amigo para todas as horas. Me escolha se você valoriza conselhos honestos e comida farta.


Dr. Jekyll/Mr. Hyde (O Médico e o Monstro, de R.L. Stevenson)

Educado de manhã, selvagem à noite. Aceite o match se gosta de surpresa — e entende dias de mau humor.


Pierre Bezukhov (Guerra e Paz, de Liev Tolstói)

Filósofo de ocasião, entusiasta de longas conversas e sobremesas reflexivas. Dê um match se você também se perde pensando.


Werther (Os Sofrimentos do Jovem Werther, de Goethe)

Especialista em cartas apaixonadas e lágrimas sinceras. Me escolha se você vê beleza no drama — e não foge de sentimentos.


Cândido (Cândido, de Voltaire)

Otimista persistente, mesmo sem motivo. Aceite o match se você acha que tudo acaba bem — e ainda ri das desgraças.


Ivan Karamázov (Os Irmãos Karamázov, de Dostoiévski)

Debatedor incansável, perguntas sem resposta são meu passatempo. Dê um match se insônia filosófica for música para seus ouvidos.


Rosalinda (Como Gostais, de Shakespeare)

Disfarces, metáforas e sorrisos de duplo sentido. Me escolha se você gosta de brincar com palavras e mudar de roupa sem aviso.


Frankenstein (Frankenstein, de Mary Shelley)

Coração de sobra, costurado em detalhes. Aceite o match se você sabe ver além das cicatrizes.


Leopold Bloom (Ulisses, de James Joyce)

Caminhante profissional, atento a tudo. Dê um match se você aprecia o cotidiano reinventado.


Hester Prynne (A Letra Escarlate, de Nathaniel Hawthorne)

Carrego letras e histórias, mas peso nunca me faltou. Entre se você acredita em recomeço sem julgamento.


Julien Sorel (O Vermelho e o Negro, de Stendhal)

Ambição voraz, sentimentos escondidos no bolso do paletó. Me escolha se ascensão social e drama te divertem.


Meursault (O Estrangeiro, de Albert Camus)

Sol, praia e honestidade que assusta. Aceite o match se sentimentos são opcionais e filosofia é seu esporte de verão.


Hercule Poirot (O Assassinato de Roger Ackroyd, de Agatha Christie)

Bigode imbatível, mistérios resolvidos antes do jantar. Dê um match se você aprecia lógica — e croissants.


Ivan Ilitch (A Morte de Ivan Ilitch, de Tolstói)

Pensador de última hora, conversa boa à meia-luz. Entre se chá morno e reflexão profunda não te entediam.


Pantagruel (Gargântua e Pantagruel, de Rabelais)

Banqueteiro profissional, humor de gigante e risada fácil. Aceite o match se apetite e gargalhada não te assustam.


Josef K. (O Processo, de Franz Kafka)

Acusado em tempo integral, réu em todos os sonhos. Me escolha se você tem tempo para labirintos e não espera respostas diretas.


Adso de Melk (O Nome da Rosa, de Umberto Eco)

Noviço, aprendiz de detetive e amante de enigmas. Aceite o match se biblioteca é seu templo — e mistério, seu vício.