Autor: Eberth Vêncio

Última oportunidade do ano para se fazer merda

Última oportunidade do ano para se fazer merda

Anda! Me ama! Me alimenta! Me enlaça! A graça está mesmo no ingresso das línguas pelos vincos das palavras. Engraçado: apesar de tudo, sinto-me triste. Livros. Trago-te livros. Larvas. Escuto larvas que se movimentam na tessitura cadavérica da lavra de um poeta que fui. “La mer! La mer!”. A merda do francês que nunca aprendi antes de morrer na praia. Trago-te também a minha mais completa ignorância, o mórbido vapor do cigarro que torna o meu beijo ainda mais saburroso.

Se for para envelhecer, que seja como Paul McCartney Foto / Mazur Travel

Se for para envelhecer, que seja como Paul McCartney

Nem tudo é o que parece. Paul McCartney não existe. Todo mundo sabe que ela morreu num acidente automobilístico em meados dos anos 1960. Para evitar escândalo, comoção e altos prejuízos financeiros no auge da beatlemania, a sua morte trágica, precoce, foi completamente abafada. Mais ou menos. A mim, não enganaram. Por exemplo, na capa do disco ‘Abbey Road’, ele é o único dos Beatles que atravessa descalço sobre a faixa de pedestres, segurando um cigarro com a mão direita. Que gafe. Que patacoada. Todo mundo sabia que Paul era canhoto. Havia sinais inequívocos de que ele tinha mesmo batido as botas.

A culpa pela derrocada do futebol brasileiro é dos jogadores que fazem as sobrancelhas

A culpa pela derrocada do futebol brasileiro é dos jogadores que fazem as sobrancelhas

Andava no estágio de tolerância mínima com os pernas-de-pau que se julgavam verdadeiras sumidades. Pode parecer frescura, mas, eu tinha prometido nunca mais assistir aos jogos da seleção brasileira. Mas, sabem como é, não sou um sujeito confiável. Era Brasil versus Argentina. O maior clássico da América Latina. Lá estava eu, estatelado sobre o sofá de couro de bolsominion, assistindo a meia hora de tretas, de socos e de pontapés entre torcedores bestializados que ocupavam as arquibancadas do Maracanã.

Quem vai tomar conta das mulheres quando ninguém estiver olhando

Quem vai tomar conta das mulheres quando ninguém estiver olhando

Escolada na dor, Maria da Piedade receava pela integridade dos filhos, em especial, das pequeninas. Havia uma escalada de violência na comunidade, uma região da cidade abandonada pelo poder público, onde nem mesmo a polícia entrava. Em comum acordo com José Donizete, o esposo há meses desempregado, acordaram que ele acompanharia as crianças, nas idas e vindas da escola, situada a meia hora de caminhada por ruas de terra esburacas e poeirentas.

Os homens são os camundongos de Deus

Os homens são os camundongos de Deus

O movimento de pessoas na rua era intenso. A constatação de que fora acometida por uma amnésia lacunar a consumia. Checou os rins. Abriu a bolsa. O dinheiro, os cartões de crédito, as chaves de casa, o celular, a Beretta e o batom ainda estavam lá. Não fora roubada. Parecia estar noutra cidade. Confusa, cambaleou até uma banca de revistas. Pediu um copo de água com bolinhas. Explicou ao vendedor que havia se perdido e que não reconhecia aquele lugar.