Não se faz um bom faroeste sem personagens consumidos por uma sede de retaliação, que atiram-se sem medo a uma jornada contra quem ameaça a harmonia de sua terra e macula a honra de sua família. A premissa torna-se ainda mais matadora quando vai chegando a hora do bom e velho acerto de contas, e vaqueiros e xerifes assumem a estatura de sacerdotes profanos e bárbaros, mestres na alquimia de viver do lado mais primitivo da natureza. Lamentavelmente, apagaram-se seu prestígio e sua atuação, restando apenas a lembrança do período em que foram os grandes desbravadores de uma nação ainda por se conhecer, grandeza que “Os Abandonados” resgata de alguma forma. Cheia de reviravoltas, a série de Kurt Sutter mira as desavenças entre duas famílias, um amor proibido e um segredo, narrativa que preenche os sete episódios sem que nada jamais falte ou sobre.
Miúdos gestos, pactos velados e escolhas misteriosas sedimentaram uma história marcada por culpas e silêncios. Enterrada debaixo de anos de crimes, a verdade vai se impondo e ameaça vir à superfície, fazendo com que velhas feridas se reabram e deixando claro que segredo nenhum fica adormecido para sempre. Em Angel’s Ridge, no território de Washington, os Van Ness e os Nolan matam-se por poder. E isso não é apenas força de expressão. Atrocidades são cometidas de parte a parte na defesa de um tesouro oculto sob o chão, e essa guerra prolonga-se no tempo, dando azo a um turbilhão de novos (e sangrentos) conflitos. Os diretores Otto Bathurst, Gwyneth Horder-Payton e Stephen Surjik conseguem iluminar pontos de vista originais sobre os rudimentos da questão fundiária nos Estados Unidos dos anos 1850, resolvida à custa de tramoias e bala. E aqui os maridos e filhos homens é que são os coadjuvantes.
Constance Van Ness e Fiona Nolan são as autoridades máximas em suas respectivas dinastias, mandando até nos sentimentos de seus filhos. Sutter e sua equipe de roteiristas desviam do óbvio ao mostrar Constance como uma figura inequivocamente tirânica, mas frágil, que anseia por resgatar a dignidade de seu clã, ultrajada numa circunstância vagamente exposta na abertura e acerca da qual saber-se-á mais no sétimo capítulo. Comportamento parecido tem Fiona, e malgrado não seja uma surpresa, o choque entre as duas é primoroso. Não é fácil dizer quem se sai melhor, mas a escalação de Gillian Anderson e Lena Headey é o tiro mais certeiro nesse inspirado bangue-bangue.
Série: Os Abandonados
Criação: Kurt Sutter
Ano: 2025
Gênero: Faroeste
Nota: 8/10




