Netflix traz Sofia Carson e Corey Mylchreest em comédia romântica que divide opiniões, mas merece atenção Divulgação / Netflix

Netflix traz Sofia Carson e Corey Mylchreest em comédia romântica que divide opiniões, mas merece atenção

Anna de la Vega seria diferente, mesmo que fosse igual a tantas outras heroínas já visitadas pelo cinema. Uma carreira exemplar, prêmios brilhantes emoldurados nas paredes, clássicos da literatura rigorosamente anotados com post-its coloridos; destinos metodicamente planejados. Tudo perfeitamente organizado até Oxford, a poça suja, metáfora grosseira, acidente proposital de um roteiro que insiste em não levar-se a sério enquanto, paradoxalmente, tenta exibir profundidade literária.

Há experiência na equipe criativa por trás do projeto. O diretor Iain Morris demonstrou anteriormente, em “The Inbetweeners”, competência ao retratar jovens adultos enfrentando dilemas existenciais de maneira cômica e autêntica. Aqui, porém, o diretor parece desconfortável no território mais dramático, tentando aplicar sua visão leve a um texto que exigiria uma abordagem mais sutil. Morris revela-se especialista em captar a atmosfera jovem e divertida, mas talvez menos habilidoso na tarefa delicada de traduzir nuances emocionais profundas.

A narrativa prometida por Julia Whelan em seu romance original oferecia algo distinto ao gênero, abordando temas feministas, sonhos individuais e tensões culturais com sofisticada sutileza. No entanto, o roteiro adaptado por Allison Burnett e Melissa Osborne, ambas com histórico reconhecido na indústria, dilui esse potencial. A especialização das roteiristas em capturar dramas sentimentais não garante, dessa vez, a profundidade necessária para explorar as complexas questões identitárias de Anna. Ao invés disso, optam por um caminho fácil, no qual o conflito emocional feminino é subestimado diante da presença masculina mais acessível e dramática.

Anna chega a Oxford como quem atinge um sonho antigo, mas a cidade não a recebe, mantendo-se distante, quase indiferente. Não há estranhamento genuíno, apenas caricaturas ligeiramente desgastadas: piadas fáceis sobre sotaques, chá quente demais, a chuva como clichê incansável para encontros românticos previsíveis. Oxford, cidade cheia de tradição e história literária, permanece fria e alheia às buscas emocionais de Anna, como se o cenário previsse antes dela mesma a superficialidade do romance em curso.

Mais perturbadora ainda é a forma como o filme lentamente dilui Anna até restar apenas sombra. Seu passado acadêmico impecável, sua admiração pela Professora Styan e suas aspirações pessoais rapidamente tornam-se detalhes decorativos. A narrativa, num movimento contrário às expectativas, transfere o protagonismo para Jamie Davenport, interpretado por Corey Mylchreest, cuja presença magnética domina e redefine o foco do drama. Anna é quase apagada diante da complexidade emocional mais óbvia e teatral de Jamie.

Sofia Carson, com sólida experiência em filmes que exigem intensidade emocional e sutileza interpretativa, sustenta o papel apesar do texto irregular. Seus olhos carregados de melancolia conferem autenticidade até mesmo às falas mais previsíveis. Mylchreest, por sua vez, utiliza seu carisma natural e talento para oferecer humanidade e vulnerabilidade ao personagem, mesmo quando este flerta com o estereótipo. A química entre ambos revela experiência e domínio técnico, dando breves lampejos do que o filme poderia ter sido caso fosse mais corajoso ou honesto consigo mesmo.

O destaque inesperado é Charlie Butler, interpretado com rara inteligência por Harry Trevaldwyn. Butler, personagem secundário, ironicamente se torna o mais real, o mais honesto emocionalmente, roubando cenas com humor ácido e diálogos afiados. Talvez seja nele que resida o verdadeiro espírito de Oxford, uma inteligência sutil, que capta nuances que Anna e Jamie, presos em dilemas superficiais, jamais percebem.

Do ponto de vista técnico, há inegável competência. Isabella Summers, premiada compositora britânica, entrega uma trilha sonora envolvente, apesar de emocionalmente excessiva para o roteiro oferecido. As editoras Victoria Boydell e Kristina Hetherington exibem destreza ao dinamizar cenas banais através de cortes rápidos, técnica eficiente, mas incapaz de esconder a falta de densidade emocional das sequências. Remi Adefarasin, veterano diretor de fotografia, oferece imagens impecavelmente compostas, embora o resultado final careça de alma, reiterando a artificialidade narrativa que permeia o filme.

A autoridade da equipe técnica é inquestionável, porém o talento reunido não basta para salvar um roteiro que hesita entre profundidade e sentimentalismo fácil. A confiabilidade esperada pela adaptação de um romance reconhecido se desfaz ao negligenciar as questões centrais que poderiam sustentar a história: identidade, ambição, pertencimento cultural e a fragilidade emocional diante do amor inesperado.

“Meu Ano em Oxford” deixa uma sensação desconfortável de potencial desperdiçado. Existe competência suficiente no elenco, na equipe e na direção para entregar algo memorável, mas talvez tenha faltado confiança na inteligência emocional do espectador. O que poderia ser uma reflexão poderosa sobre sonhos, identidade feminina e amor transformador reduz-se à suavidade esquecível das narrativas românticas genéricas.

Resta uma melancolia estranha, não apenas pela história contada, mas por aquilo que deixou de ser explorado com a coragem e honestidade emocional que o público, experiente no gênero e já treinado por dramas bem-sucedidos como “A Culpa é das Estrelas” e “A Cinco Passos de Você”, esperava. Uma narrativa com elementos suficientes para se destacar, mas que escolhe permanecer no seguro caminho da previsibilidade, renegando o compromisso tácito entre o cinema e a verdade emocional do espectador. Talvez seja exatamente essa recusa em arriscar-se ao genuíno que mais incomode e permaneça após o fim dos créditos.

Filme: Meu Ano em Oxford
Diretor: Iain Morris
Ano: 2025
Gênero: Comédia/Romance
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★