O Pink Floyd e eu em Pompeia

O Pink Floyd e eu em Pompeia

Há quarenta anos, um grande dilema aboletou-se na minha mente: deveria eu trocar meu carro velho por um mais novo ou comprar um aparelho de videocassete? Hoje parece brincadeira, mas em 1985 um videocassete chegava a custar cerca de ¼ do valor de um carro popular novo. Estávamos nos primeiros anos daquela nova forma de entretenimento que era escolher e assistir filmes ou shows no conforto do lar. Meu carro era velho e cheio de problemas, mas cumpria sua função, e eu resolvi encomendar, via Paraguai, o incrível aparelho de gravar e reproduzir imagens e sons.

Naquela época, Goiânia contava com poucas locadoras de vídeo, e a maioria do acervo delas era composta por fitas de gravação artesanal, para não dizer piratas. A questão da originalidade só veio a se estabelecer anos depois. Para minha sorte, numa locadora da Av. Tocantins, cujo nome se perdeu na poeira do tempo, eu encontrei uma fita VHS original do filme-concerto “Pink Floyd at Pompeii”. Não me importava que o filme fosse sem legendas, já que seu conteúdo principal era o concerto do Pink Floyd no anfiteatro da cidade de Pompeia, na Itália, aquela que foi soterrada por uma erupção do Monte Vesúvio no ano de 79 e só foi redescoberta no século 18.

Eu estava ansioso por assistir a esse filme desde que, cerca de 10 anos antes, eu vira na TV alguns trechos dele no Programa Sábado Som, comandado pelo eterno e incansável Nelsinho Motta. Inclusive a abertura do programa era um trecho da música “Echoes”, que está no “Pink Floyd at Pompeii”, com imagens dos quatro membros da banda andando pelas encostas do Vesúvio. Esse programa era sensacional, e com ele eu passei a conhecer muita coisa boa do rock mundial daqueles tempos.

Algum tempo depois de devolver a fita à locadora, após passar aquele fim de semana vendo e revendo o filme, ocorreu-me fazer uma “versão alternativa” dele. Bastava eu conectar dois aparelhos de videocassete e copiar o conteúdo da fita original para uma virgem. Para meu grande espanto, ao alugar novamente a fita na locadora, percebi, quando cheguei em casa, que alguém tivera a mesma ideia de copiar o filme. Só que a tal pessoa foi muito perversa: ficou com a original e devolveu a cópia à locadora. Fiz uma cópia assim mesmo, apesar da imagem ter ficado bastante degradada. Relatei o ocorrido à locadora, porém não puderam fazer muita coisa, já que o controle era bem deficiente ainda.

Pois foi essa fita “alternativa” que eu gravei que garantiu o meu deleite por quase vinte anos, até que, em 2003, eu pude adquirir o meu concerto favorito em DVD oficial.

O que faz de “Pink Floyd at Pompeii” um espetáculo tão intenso e original até os nossos dias? O Pink Floyd, em 1972, já havia achado seu caminho musical após um certo período de incertezas com a saída de seu primeiro e genial líder, Syd Barrett, que fora obrigado a sair da banda em 1968, por conta da deterioração de sua saúde mental. Além disso, o Pink Floyd vivia um momento de coesão e harmonia entre seus membros e se preparava para chegar ao ápice de sua carreira no ano seguinte, 1973, com o lançamento do álbum “The Dark Side of the Moon”. Um outro motivo que desagrada alguns fãs, mas que para mim foi fundamental, é que os músicos tocaram ao vivo e sem plateia.

O diretor do filme, Adrian Maben, foi quem teve a ideia de gravar a banda no anfiteatro de Pompéia e sem plateia, para fazer um contraponto à maioria dos filmes de rock que focavam muito nas reações, e barulho, do público. Ele acabou por realizar um filme-concerto original e com excelentes tomadas do Pink Floyd em ação na arena, entremeadas por entrevistas com os músicos nos estúdios de Abbey Road, em Londres, e trechos deliciosos da gravação da obra-prima “The Dark Side of the Moon”.

No final de abril e grande parte do mês de maio deste ano, vivi horas de expectativa e euforia que só têm paralelo com os momentos vividos há cinquenta anos, quando eu e meu irmão aguardávamos ansiosos a chegada do álbum “Wish You Were Here”, de 1975, também do Pink Floyd, às lojas de discos. Agora era a espera pela entrega do álbum duplo em disco de vinil “Pink Floyd at Pompeii MCMLVII”, pela primeira vez lançado oficialmente com as músicas executadas no filme.

A grande ironia nessa minha expectativa é que, cerca de duas horas antes dela tomar conta da minha mente, eu e os amigos Alan, Enzo e Fábio nos acomodávamos nas poltronas de uma sala de cinema para assistir a uma sessão especial do filme restaurado, com áudio remixado e remasterizado. Antes do filme começar foi exibido um anúncio promovendo o lançamento do álbum duplo com as músicas do filme, ao que o Alan me perguntou: — Vai comprar, Paulo? E eu respondi: — Ah, acho que não, já tenho o DVD! Terminada a exibição, extasiado, eu me virei para o Alan e disse: — Mudei de ideia, vou encomendar os discos!

Só que dessa vez eu não precisei esconder da minha mulher mais uma extravagância, como eu fazia para esconder de minha mãe minhas aquisições — e “Wish You Were Here” foi uma dessas —, ao entrar em casa com o disco escondido na sacola de compras da minha irmã.