O filme mais aguardado de 2025 acaba de chegar à Netflix Divulgação / Netflix

O filme mais aguardado de 2025 acaba de chegar à Netflix

Desde que o cinema decidiu brincar com o conceito de imortalidade, uma contradição elegante atravessa essas narrativas: quanto mais eterno o personagem, mais palpável se torna a ferida do tempo. Em “The Old Guard”, lançado pela Netflix em 2020, essa contradição foi o alicerce para um thriller inusitado, onde heróis não usam capas, mas carregam cicatrizes — algumas invisíveis, outras literalmente esculpidas por séculos de batalhas e perdas. Distante dos arquétipos glorificados, os guerreiros imortais de Gina Prince-Bythewood chegaram às telas como figuras despedaçadas, atoladas em dúvidas morais, fadiga emocional e vínculos que resistem não pelo romantismo, mas pelo desgaste do convívio milenar. O que poderia ser apenas um filme de ação funcional tornou-se um experimento agridoce, onde a brutalidade se mesclava a dilemas existenciais e onde, curiosamente, a eternidade parecia menos um privilégio e mais um fardo com data de validade emocional.

Cinco anos depois, “The Old Guard 2” tenta expandir esse universo, mas tropeça no mesmo dilema que assombra seus personagens: a longevidade nem sempre garante profundidade. Sob a direção de Victoria Mahoney, o segundo capítulo abandona a introspecção minuciosa da estreia em favor de uma construção mitológica mais ambiciosa — e, por vezes, mais superficial. A trama retoma o fio onde o primeiro filme o deixou, com o retorno de Quỳnh (Veronica Ngô), condenada a séculos de agonia no fundo do mar, em um looping perverso de afogamento e ressurreição. Ressentida, ela se alia à enigmática Discórdia (Uma Thurman), outra imortal que carrega não apenas séculos de vida, mas também desconfianças antigas. O embate que se desenha não é mais sobre salvar a humanidade — esse ideal, como a imortalidade, se mostrou ilusório —, mas sobre a colisão inevitável entre divindades cansadas e a inevitável erosão das relações humanas, mesmo quando atravessam milênios.

No entanto, ao tentar sustentar o peso desse novo panteão de personagens e conflitos, o roteiro se desequilibra. A sofisticação emocional do primeiro filme cede espaço a explicações didáticas e construções artificiais, como bibliotecas secretas, pictogramas antigos e diálogos expositivos que tentam, sem muito êxito, transformar o caos da eternidade em um manual compreensível. É um curioso paradoxo: quanto mais as regras desse universo se explicitam, menos intrigante ele se torna. Ainda assim, Mahoney oferece lampejos de sutileza, como a elegante sequência em plano contínuo que percorre os séculos de história compartilhada entre Andy (Charlize Theron) e Quỳnh, transbordando aquilo que o texto verbal não consegue traduzir — o acúmulo silencioso de dor, perda e mágoa que o tempo não apaga, apenas transforma em cicatriz.

O elenco, ciente do desafio de habitar personagens que já deveriam estar esgotados por suas próprias existências infinitas, preenche as lacunas que o roteiro deixa. Charlize Theron, com sua presença cortante e a estética que mescla o desencanto de Joan Jett com a determinação de uma guerreira ancestral, ancora o filme com uma intensidade que o texto raramente sustenta. Veronica Ngô, mesmo subutilizada, entrega em silêncios e olhares aquilo que as falas não ousam construir: o rancor amargo de uma mulher traída pela promessa vazia da imortalidade. E Uma Thurman, com a ironia de quem já redefiniu o arquétipo da mulher letal em “Kill Bill”, injeta carisma e exagero pulp no papel de Discórdia, ainda que a tão aguardada colisão entre ela e Theron se resolva em um piscar de olhos, deixando no ar mais frustração do que catarse.

Mas o que realmente tensiona “The Old Guard 2” não está apenas na fragilidade estrutural ou na escolha estética de priorizar o espetáculo à reflexão. Está no fato de o filme parecer menos uma obra fechada e mais um episódio de transição dentro de uma franquia que, até agora, caminha com passos incertos. A narrativa se organiza como um prólogo inflado, apontando para grandiosidades futuras que o espectador sequer sabe se verá. O cronograma de produção caótico, atravessado por greves e mudanças corporativas, reflete essa incerteza: o terceiro filme, prometido nas entrelinhas, permanece uma miragem. E assim, em uma história que deveria celebrar ou confrontar a eternidade, o que sobra, ironicamente, é a ansiedade efêmera do agora — e a suspeita de que talvez alguns mitos sejam mais fascinantes quando se recusam a durar.

Filme: The Old Guard 2
Diretor: Victoria Mahoney
Ano: 2025
Gênero: Ação/Aventura/Fantasia/Thriller
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★