Eu sou o idiota útil de quem o capitão falava

Eu sou o idiota útil de quem o capitão falava

Eu sou o idiota útil de quem o capitão falava. Eu assalto navios de refugiados para saquear o medo. Por isso mesmo, nado de braçadas em oceanos de dúvidas. Por que não afogar as mágoas de um mundo tão injusto? Baby, eu só bebo porque não posso te comer.

Eu faço parte da imensa massa de manobras dos meus sentimentos mais profundos. Eu, o mar e as pérolas de ignorância. Estou, simplesmente, seguindo o fluxo, deixando-me levar. Devo todo esse aparato estranho, esse aparente estado de desequilíbrio emocional momentâneo, às gangorras risonhas da minha velha infância. Uma hora por cima. Outra hora por baixo. Quase sempre sorrindo, contente, brincando de viver, esperando pelas coisas boas do mundo.

Há muitos mais agruras do que eu sequer supunha durante toda a meninice. A esquisitice está em alta e é exibida como se fosse um troféu, um atributo indelével do ser humano. Os meus olhos perderam o prumo. Eu sou o sumo sacerdote da minha própria seita agnóstica. Dedico-me à missão pernóstica de confundir os incautos. Eu creio mesmo é nos índios, no INPE, no tamanduá em chamas, na chuva e nos bolinhos de chuva preparados pelas avós. Em tempos de estio, desertos bradam na minha voz. O meu peito virou mata devastada. Solidão.

Eu sou aquele indivíduo sem noção que se emociona com poesia, que toca fogo no crivo e esquenta o rango para um grande amor. Eu sou o trouxa que acelera nas curvas da mulher amada e que abre a porta do passageiro para a felicidade entrar. Eu costumo ser cavalheiro com a vida, embora, ela insista em manter contra mim um enorme mistério. A que viemos? Eu sou o homem ingênuo, nanico, irracional, exasperado, que ainda se sente apegado ao fosfórico, ao abstrato, idealizando mundões-velhos-sem-porteiras.

Eu acredito na gentileza, nas mulheres feias, especialmente, nas francesas. Ah… As francesas… Pode-se ser burro para sempre, Brigitte Bardot. A beleza, um dia, acaba. Estamos alinhados. Sou eu quem mama nas tetas muxibentas da mulher amada. A beleza reside, acima de tudo, nos gestos e nas palavras. O povo não devia depositar os seus votos de confiança nos homens desequilibrados. Eu não; eu voto em preto, principalmente, nos chicoteados que moram sob marquises e se amarram em comer chocolate.

Confesso que já cometi o doce delito de furtar um Sonho de Valsa no pegue-pague da esquina. Foi muita sorte não ter sido pego. Foi muita sorte ter nascido branco. Valso de rostinho colado com a melancolia. Isso é um vício lastimável. A vida come a gente pelas beiradas, sabes como é.

O bullying, agora, é oficial em todos os escalões: ninguém mais passa fome no país. Os famintos deviam se unir, deviam se amotinar para comer os cérebros dos arrogantes. Apetite por justiça social é o que não falta. Além disso, em caso de má digestão, há Emulsão Scott de sobra nas prateleiras do SUS para derreter os miolos dos déspotas fanfarrões pelos orifícios oficiais da colostomia.

Uma gata mia no telhado. É hora de aproveitar a insônia, levantar e escrever um texto que fale sobre as mil e uma utilidades da idiotice. Protestar, por exemplo.