Autor: Larissa Bittar

Ao tratar com ternura a luta do outro, a nossa fica mais leve

Ao tratar com ternura a luta do outro, a nossa fica mais leve

A todo momento alguém espera do mundo o alento que falta. Aguardamos que pesares sejam amenizados pela compreensão alheia, pela boa vontade do outro em preencher com graciosidade buracos incômodos. Que bom seria se a cada dia ruim encontrássemos pelas ruas sorrisos sinceros, se para cada briga em casa houvesse uma praça com pipoqueiro simpático e balões coloridos. Por toda parte, porém, há gente passando por males e tropeços. No nosso egoísmo ora proposital, ora inconsciente, ditamos a regra do jogo como juízes de um time só.

‘Deixar para amanhã’ é a maneira mais eficiente de jogar a vida fora

‘Deixar para amanhã’ é a maneira mais eficiente de jogar a vida fora

Não se trata aqui de um passeio trivial que não aconteceu ou da minha falta de vitamina D, que tem me prejudicado. Trata-se do hábito incorrigível que muitos temos de adiar felicidade como se a vida estivesse sempre disposta a nos devolver no futuro os momentos que hoje negligenciamos. O problema é que se por um lado a vida é generosa e oferece a possibilidade de recomeço, por outro ela é implacável quando resolve dizer: passou. Já era.

Ser feliz não é direito. É obrigação

Ser feliz não é direito. É obrigação

Todos os dias, em cada canto do mundo, alguém espera ser recompensado pela batalha diária, pela bondade, pelas boas intenções. Mas como disse meu amigo, ser feliz não é troféu por mérito, é comprometimento. É recusar afundar miseravelmente a própria história em lamentos e dores. É esperar menos dos céus e mais de si mesmo. Nas salas de aula dos cursos de filosofia e nas capas dos livros de autoajuda, do alto da torre Eiffel ou embaixo do viaduto do Chá, nos vídeos motivacionais do YouTube e nas rodas de amigos está lá, batendo ponto, o desejo de encontrar a fórmula mágica para transformar em contentamento as agruras diárias.

A criança de ontem ainda se manifesta. Você decide se ela brinca ou tem medo de escuro

A criança de ontem ainda se manifesta. Você decide se ela brinca ou tem medo de escuro

Às vezes me vejo tentada a tirar dos ombros o peso das responsabilidades e ir correndo para o quarto abraçar o travesseiro. A gente resgata do passado o conforto que existia na infância, a possibilidade de curar com Merthiolate e colo de mãe as quedas e feridas. Mas é preciso abrir os olhos, encarar as perdas, vulnerabilidades e obstáculos. É necessário lavar o rosto, tirar a pantufa do Bob Esponja e pagar os boletos. Recordo-me com saudosismo do dia em que conseguir dominar a bicicleta cor-de-rosa era o problema do ano. Por outro lado, é prazeroso e reconfortante ver agora em mim o reflexo da criança que fui e das alegrias e percalços que deram o tom da trajetória até aqui.

O trabalho dignifica o homem. O lazer dignifica a vida

O trabalho dignifica o homem. O lazer dignifica a vida

“Escolha um trabalho que você ame e não terá que trabalhar um único dia em sua vida.” A frase do pensador Confúcio tem sido o mantra de muitos que, embalados pela concepção de que ofício e prazer não precisam se opor, buscam um estilo de vida no qual a fonte de renda seja também fonte de alegria e satisfação pessoal. A questão é: trabalho é sempre trabalho. Pode ser bom, pode ser até divertido, mas não substitui a capacidade que só o lazer possui de tirar o peso de um cotidiano regido por prazos, horários, metas.