Viver em sociedade adquire notas de uma disputa constante entre o bem e o mal, em que, como sabemos todos, quase sempre este último é o vencedor. Vilões dos mais altos coturnos se fundem às multidões, escondem-se nos ambientes mais insuspeitos, tiram a lei para dançar e sapateiam sobre ela na primeira oportunidade, amparados pela morosidade da justiça. Em “Operação: Arma Secreta”, o polonês Daniel Markowicz captura um elemento bastante particular desse caldo de generalizada desordem, onde viceja uma imensa gama de novos delinquentes, que por seu turno encobertam outros criminosos, e esse círculo vicioso só se completa no instante em que surge alguém disposto a personificar o heroísmo um tanto autodestrutivo que poupa os demais. Aqui, os bandidos surgem especialmente ousados e donos de uma astúcia espantosa, capaz de levá-los a criar um engenhoso artifício, passaporte para uma era de muito mais incerteza, muito mais dor, muito mais abusos e uma reação pontual, mas avassaladora. Markowicz pula de um gênero para o outro, moldando a ficção científica desabridamente vesana de uma melancólica distopia a lances em que a ação suaviza um possível arrefecimento da história.
No porão de um barco, homens mal-encarados deliberam a respeito de uma manobra contra o sequestro de uma mulher, feita refém numa base perto da costa da Polônia por um chefe militar local. O roteiro de Markowicz e Dawid Kowalewicz se vale dessa descontraída primeira sequência para inserir o espectador na tensão que vem pouco depois, com mercenários se deslocando para o suposto cativeiro a fim de resgatá-la, momento em que a narrativa começa a derivar para um suspense meticuloso, apontando para a solução precoce do caso. Naturalmente, Markowicz e Kowalewicz desautorizam qualquer conclusão nesta altura do enredo, girando o leme para um drama de família que conserva o interesse da audiência. Presa, o anti-herói encarnado por Piotr Witkowski num desempenho notável, se depara com o irmão, personagem de Mateusz Rzezniczak, em circunstâncias que interditam de todo manifestações de carinho de parte a parte. Depois da interferência de Krzysiek, o gângster bonachão de Sebastian Stankiewicz, que executava um servicinho nada comum, o segundo ato tem início com um tiroteio em que não se distingue ao certo os mocinhos dos vilões, um dos trunfos do filme, graças a coreografias milimetricamente calculadas, de modo a aumentar ainda mais a brecha para especulações quanto a índole do protagonista. A tal Caçadora de Almas, dispositivo que transforma seres humanos em feras indomáveis que matam sob o comando dos poderosos de turno, sofre, enfim, uma avaria que talvez mude o curso dos acontecimentos. A reedição da boa parceria de Markowicz e Witkowski, vista em “Plano de Aula” (2022), deixa claro que a dupla é, sem exagero, a nova cara do cinema polonês, pródigo de bons filmes que também vibram nesse diapasão, a exemplo de “Bartkowiak” (2021), também de Markowicz; “Hejter” (2020), de Jan Komasa; e “Como Me Apaixonei por um Gângster” (2022), de Maciej Kawulski.
Filme: Operação: Arma Secreta
Direção: Daniel Markowicz
Ano: 2023
Gêneros: Ficção científica/Aventura/Ação
Nota: 8/10