O coração é um tsunami de “sim” e “não”

O coração é um tsunami de “sim” e “não”

Você assiste a um jornal na televisão e, lá pela sexta notícia, percebe que até então nada de bom e feliz foi falado. De repente, um terremoto invade seu coração, bagunçando o alicerce da sua certeza. O mesmo sentimento levantou um turbilhão de angústia quando seu olhar foi arrastado pelo tornado impiedoso que levou casas, árvores e vidas. Você se sentiu desmoronar ao assistir aquelas pessoas perderem seus risos e a esperança.

Estamos rodeados por notícias violentas em todas as partes do mundo. Pessoas morrem queimadas e crianças são enterradas vivas. Como entender o que não há explicação? Nessas horas, ficamos paralisados. Sentimo-nos sozinhos, mesmo não sendo sós. Olhamos o horizonte e faltam palavras. Não há luz, nem cores, nem nada.

Nada é certo nesta vida, não é mesmo? Dormimos e acordamos, trabalhamos e sonhamos, amamos e sofremos. Vivemos em função de rotinas feitas, mas temos poucas certezas. Um dia, sem mais nem menos, chega o vendaval da morte e nos leva tudo.

Como querer viver depois de perder mais de metade da família? Fora as catástrofes naturais, como lidar com o terrorismo, as guerras e a ganância? E, ainda, como lidar com nossas mortes diárias? Como ser feliz sendo espectador do horror? Parece impossível brotar uma flor em solo de pedras amarguradas.

Desliguemos um pouco a televisão e vamos pensar. Por um momento, parece que nada temos a dizer. É como a folha em branco nos desafiando a escrever. O mundo emudece na loucura das coisas como elas são. Tantas pessoas vivendo como inimigas. Tanta morte sem tempo do perdão. Pouca sorte para quem nada temia.

Eu penso em você. Você pensa em mim. Choramos por nós. Nesse devaneio, percebemos a contradição: “Só a guerra faz nosso amor em paz”. Somos uma mistura de medo e fé. Amor e ódio. Culpa e perdão. Somos dia e sol, noite e lua. O possível e o provável. O coração é um tsunami de “sim” e “não”.

Como disse Carlos Drummond de Andrade em seu poema “Mundo Grande”, “meu coração não é maior que o mundo, é muito menor”. Aqui dentro não cabe a minha dor, por isso preciso me despir e me cortar. Já o mundo, esse é tão grande, cheio de homens de diferentes cores e diversas dores. E é lá fora que a vida cresce entre o fogo e o amor, onde os homens trazem a notícia que nosso mundo se transforma entre guerras e paz.

Nosso coração é livre para crescer e explodir, mas também é livre para escolher e compreender que sozinhos não há como enfrentar o mundo.

Por isso, nossa maior catástrofe seria deixar de acreditar. O coração nunca será cheio de certezas, mas é na companhia uns dos outros que podemos mudar. Juntos, aprenderemos nossas batalhas, conheceremos nosso sofrimento e nossa fé. Juntos, criaremos um futuro.

O medo da morte é a anestesia da vida. Se for preciso recomeçar do nada, é do nada que a semente nascerá. Começaremos mesmo sem saber. É como escrever o que vier por linhas imprecisas, pra esperança se multiplicar e a vida continuar.