Não importa se acabou. Amar é recomeçar

Não importa se acabou. Amar é recomeçar

Uma vez meu pai trouxe pra casa uma bacia cheia de cajus amarelos e vermelhos que foram colhidos na chácara de um amigo. O aroma doce daquelas frutas e o brilho de seus pedúnculos carnudos de cores vivas me fizeram imaginar, nos meus oito anos de idade, como seria a árvore que dava algo tão bonito daquele jeito.

Aquela curiosidade infantil fez meu pai nos levar ao jardim em frente da nossa casa e, juntos, nós cavamos com nossas mãos grandes e pequenas um buraco onde colocamos uma semente de caju amarelo e outra de caju vermelho.

Eu gostava de regar aquele pedacinho de terra do jardim. E passava lá quase todos os dias para ver se o cajueiro já tinha crescido. Meu pai me falava que a árvore chegaria na hora certa.

Então, um dia papai me chamou para ver o broto que havia surgido. Ficamos os dois olhando os primeiros galhos e as primeiras folhas da enorme árvore que enfeitaria a frente da nossa casa, aquele belo cajueiro que atraía as pessoas da rua por causa do seu cheiro adocicado.

O mais engraçado é que nunca gostei muito de caju, meus irmãos é que gostavam do suco que minha mãe sempre fazia. Eu gostava de ficar lá no jardim brincando perto do cajueiro. Gostava dele porque foi meu pai que o plantou junto comigo, nós éramos cúmplices desse empreendimento miraculoso da vida, e gostava da árvore principalmente quando chegava a primavera.

Acompanhava a evolução das florzinhas cor de rosa para os verdes frutos, que depois começavam a ficar avermelhados ou alaranjados. Muitos anos depois, quando adulta, passei em frente àquela antiga casa da minha infância e senti uma dor cortante dentro de mim quando não vi o meu cajueiro pela primeira vez, pois os atuais donos haviam derrubado a árvore.

Quando falei isso pro meu pai, ele pediu ao jardineiro da nossa nova casa para plantar um pé de caju no quintal. E assim, algum tempo depois, tínhamos dois cajueiros e papai me disse que o outro só poderia ter sido obra dos passarinhos.

Até hoje, quando estou no supermercado e vejo cajus à venda, eu me lembro do meu pai. Volto à minha infância, ao pequeno pé de caju que batia nos meus joelhos e aos sonhos de grandeza de uma pequenina. E, quando o silêncio aqui dentro aparece devido o barulho lá de fora, abraço as doces lembranças de um cajueiro.

Porque o cajueiro é a vida com seus galhos de esperança e seus frutos de gratidão que contrapõem a crueldade e as mazelas que nos cercam. E ele é replantado todos os dias com o trabalho sincero de mãos cuidadosas. As nossas mãos que plantam amor, amizade e respeito por cada ser vivo.

O carinho que meu pai plantou fez nascer em mim o amor por um cajueiro. E ele replantou a confiança em mim quando fiquei desolada porque minha árvore da infância tinha sido derrubada.

Nossa vida inteira será assim. Dias alegres que nos serão arrancados com suas raízes. Mas em terreno fértil sempre há lugar para brotar uma nova semente.

Assim, seremos os pássaros do nosso jardim. Vamos espalhar as nossas sementes, pois o amor que eu plantar em você nascerá em mim.