Pastor racista-homofóbico procura

Pastor racista-homofóbico procura

“Seu jeito afrescalhado de ser me ganhou.”

Se tem uma coisa que qualquer homem heterossexual em idade reprodutiva aprecia é ser elogiado, bajulado, flertado e — quem sabe até — assediado por uma mulher, a fim de trocarem experiências, fluidos, microrganismos e intimidade. Mais do que a aparência da carcaça, conta muito o charme, o bom humor, o astral positivo, a volúpia da galanteadora. Uma mulher divertida e com a libido em dia é uma arma perigosa. João Batista que o diga da bandeja.

Experts em matéria de sexualidade humana (além dos meus companheiros de happy-hour e de cerveja adulterada do Bar da Cirrose) garantem que a mulherada jamais esteve tão atirada. Nunca antes na história das cantadas malogradas, o mulherio tomou tanto a iniciativa para obter sexo casual sem compromisso afetivo. Desde o advento das minissaias e das pílulas anticoncepcionais nos anos 60, as mulheres descobriram que o orgasmo não somente era plausível (bom absurdo), mas fundamental para parar de procurar defeitos no teto do quarto.

Para o completo desgosto e cisma de um chapa meu (a lealdade entre amigos — assim como o oxigênio e a falta de fé — é uma das últimas que morre), a cantada tosca, grosseira, nada razoável, que abre o corpo deste texto foi a ele dita por outro homem, que malhava na mesma academia de letras em que ele malhava.

Pouco afeito à poesia concreta e aos halteres — muito menos aos alferes de homossexualidade enrustida — o sujeito escapuliu rapidinho daquele antro de imortais de péssima literatura, e agora prefere as caminhadas ao ar livre pelos inúmeros parques ecológicos da cidade, aliás, estâncias estas lotadas de gays, não gays, assexuados, bosta de cachorro e fãs dos livros de Paulo Coelho.

Não sei se o suposto charme atrativo do meu amigo — uma espécie de inconveniente “ímã homoafetivo” que já lhe rendeu pelos menos mais uns três dissabores de gênero — se deva a sua fala mansa, à compleição física delicada (o cara é franzino que nem o Wood Allen), à predileção pela poesia romântica, à emoção à flor da pele frente situações inusitadas, comoventes, como, por exemplo, um passarinho (na verdade, um urubu) pousado na calçada do Mercado de Peixes, pajeando um morador de rua chapado com crack.

Coisas chocantes acontecem a todo momento, embora o mundo não se sinta tão afetado assim, ao ponto de rediscutir com honestidade a humanização do ser humano, por exemplo. Hoje eu sei bem por que a maioria das pessoas crê piamente numa vida maravilhosa após a morte. Simplesmente, não está dando mais pra acreditar em qualquer coisa que respire e pense. Já entreguei os pontos: a capacidade de maquinação para o engodo e a maldade aniquila completamente a minha fé no Homem. Eita, defeitinho cruel da criação do universo…

Em tempos de indisfarçável hipocrisia moral e atrofia dos princípios éticos, tolerar os intolerantes de todos os naipes tem sido uma tarefa intolerável até mesmo para um bam-bam-bam da fé e do populismo religioso, como o Papa Chico Bento XVI. Munido com Atestado Médico e aguçado desconfiômetro, o velhinho escafedeu-se.

Exemplos execráveis não faltam: recentemente, a PF enjaulou um bando de neonazistas no sul do país, os quais recrutavam neo-cretinos para hostilizar neo-vítimas (as vítimas de sempre, ora: prostitutas, negros, gays, asiáticos, nordestinos, etc…).

No De-éfe, o Partido Social do Capeta — que faz parte da base aliada do desgoverno foderal — indicou um de seus deputados homofóbicos mais verborrágicos e talentosos para presidir a Comissão de Direito de Ficar Calado das Minorias, na Câmara de Gás dos Deputados. Mais cinismo que isto, só na trama da novela das oito que, por sinal, jamais começa às oito.

Gays, travestis, transexuais, lésbicas e simpatizantes das causas cabeludas desceram das tamancas, quebraram o pau e as unhas, tamanha a revolta pela indicação do pastor engomadinho, figura carimbada nas resenhas de piadas racistas do parlamento.

“Ora, deem a mim um voto de confiança… Quem de nós nunca teve um viadinho na família?”, ponderou o deputado, sob os apupos e gargalhadas dos companheiros. Espera-se que, a qualquer momento, uma fumacinha lilás — nos mesmos moldes do conchavo de cardeais que elegeu Chico Mineiro I para o papado — saia pelo exaustor dalgum gabinete, anunciando que outro deputado mais afeito ao cargo (ora, nem precisa do cara assumir que é gay) topa, sim, presidir a tal Comissão das Minorias pelo bem da maioria.

Caso eu não seja empalado pelos intolerantes religiosos até segunda-feira, pretendo viajar na maionese até o Detrito Foderal, participar dos protestos e passeatas contra a estapafúrdia indicação do pastor fanfarrão. Nós os gordos, carecas, negões, gagos, manquitolas, quatro-olhos, banguelas, corcundas, asiáticos, roncolhos, minhocas sem terra, poetas sem livro, acadêmicos sem fraldões geriátricos, lunáticos sem hospício (Por que diabos extinguiram a porra dos manicômios? Eram tão parecidos com o Castelo da Barbie…) exigimos um tratamento mais respeitoso e menos esculhambado por parte dos representantes do povo naquele antro oficial.

Meu amigo já declinou do convite e não irá comigo. Será que ele é?