Não há nada de novo no rugir das tempestades: apenas a barbárie

Não há nada de novo no rugir das tempestades: apenas a barbárie

Já ouço o rufar dos tambores que vem vindo no vento de estranhas estações. São os tambores dos novos bárbaros amparando a invasão em curso. Eles estão chegando com suas armas letais, com ervas, pós e chumbos, com seu combustível fóssil, com visgos para aprisionar nossas almas em gaiolas de algoritmos, com sua guerra brutal e a total insensibilidade para o sofrimento. Os bárbaros simplesmente querem detonar tudo o que construímos. Querem ver caído por terra aquilo que chamamos de progresso e civilização.

Já ouço o rufar dos tambores dos bárbaros, no horizonte próximo, nas sombras ao redor. Eles inventaram novos mapas de novas geografias, e notáveis estratégias de ocupação. Estão chegando de todos os quadrantes, por todos os meios. Uma legião de ativistas ensandecidos que não se cansa de minar nossas resistências nossos sentimentos de civilidade. Os bárbaros vieram obviamente para barbarizar tudo o que recebemos de herança e acalentamos como nossos bens maiores e legados. Os bárbaros querem transformar em cacos os cristais de nossos olhos.

Já ouço o rufar dos tambores dos bárbaros que vêm por mar, por terra, por ar e pela fibra ótica, com suas legiões em fúria, plenas de sangue nos olhos, adagas nos dentes e tangerinas de pólvora nas mãos. E não se importam de morrerem enquanto matam, de se destruírem enquanto destroem, de se evaporarem enquanto evaporam.

Já ouço o rufar dos tambores dos bárbaros que vêm vindo na esteira de nosso sangue, amparados no andaime de nossos ossos, deslizando nos humores de nossos prazeres, transitando por nossos dutos, subindo nossas escadas de DNA para usurparem o nosso bioma e finalmente se autoproclamarem os novos senhores da Terra, com seu sistema inédito de domínio e humilhação!

Já ouço o rufar dos tambores dos bárbaros que vêm pelos colóquios, pelas comissões acadêmicas, pelas conferências temáticas, pelos referendos, pelas eleições amplas, pelos votos populares, pelas ditaduras, pela democracias representativas, pelos tratados multilaterais, pelas frestas das leis e jurisprudências. Eles vêm para impor suas ideias impensadas, de depredar nossas árvores, de acelerar o processo de intoxicação do planeta, de contaminar nossas águas, de cavar bem fundo o nosso buraco e esquentá-lo como um alto-forno de extraordinária performance.

Já ouço o rufar dos tambores dos bárbaros, em forma de novas gerações que por menosprezo ou simples inapetência não conseguem entender nosso vocabulário, nem assimilar os sentimentos que acumulamos no processo civilizatório e reputamos como válidos. O filho não consegue ler a carta que o pai lhe escreveu, ou o livro que foi de suma importância para o pai. Parece que perderam a sintaxe do processo cultural. Enquanto isso, manipulam com destreza de mágicos certos dispositivos que a geração anterior não consegue compreender minimamente. Ouço o rufar dos tambores no hiato das gerações.

Já ouço o rufar dos tambores dos bárbaros e eles já se encontram em toda parte, com sua sede frenética de sangue grená, de nossos corpos mutilados, de nossos sonhos esvaídos, num ambiente ruidoso de hecatombe em pleno curso. Já ouço o rufar dos tambores.