Amores de fast food matam o coração

Amores de fast food matam o coração

A fome é tanta, a pressa, a ânsia pela saciedade consome os apressados. O mundo anda mesmo tão corrido… As vontades e quereres, sempre tão urgentes, precisam ser prontamente atendidos, porque ninguém aguenta esperar que chova na sua horta. Dizem os mais inquietos que esperar é para os acomodados, que devemos correr atrás dos sonhos, abrir os caminhos do nosso destino, botar a mão na massa e fazer acontecer. Concordo. Só que existe um porém: corre-se demais sem saber realmente o que buscar e, no desespero de conseguir o que quer — ou a ilusão do que se almeja —, os apressados se perdem, se enveredam em toda e qualquer saída. A fim de alcançar o maior número de conquistas (que neste caso não são vitórias), deixa-se de dar importância às consequências que cada uma delas traz ao coração.

Preciso confessar que eu faço parte do time dos maratonistas da vida. Sim. Quero tudo pra ontem, não me acomodo nas comodidades que meus dias me regalam. Me apavoro só de pensar numa vida sem mudanças, na rotina perfeitamente traçada sem direito a desvios. Não me bastam as certezas do meu universo, nem a quietude de uma espera consentida no portão. Eu quero mais é vendaval, tormentas abruptas que levam embora o que não é firme o bastante para permanecer. Só dessa forma eu consigo admirar a calmaria da manhã seguinte e valorar o que ficou de profundo e enraizado.

O problema de ser assim, apreciadora da velocidade por viver, é que quando os ventos não andam soprando lá com tanta veemência, a falta de emoção — mais conhecida como mesmice — cresce vertiginosamente aqui dentro. Impaciência, inquietude, incredulidade, inconformismo. Tudo junto.

Mas, enquanto o estilo apressado de ser, querer e sentir não chega ao coração, tudo bem. Porque o coração não pode, nem deve ser manejado com afobamento, ou sob qualquer outro tipo de pressão. O amor é único em sua amplitude absolutamente sucinta. Leia-se: único. Amor não é sexo, não é afinidade, não é amizade, necessidade, nem paixão ou compaixão, desejo, ensejo. Nada disso. Amor é amor. Assim, simplesmente e lindamente.

Acontece que, muitas vezes, o desespero por viver o amor é tão imenso, praticamente incontrolável, que a cegueira acomete os olhos do apurado por amar. De certo que o amor é cego, mas o anseio por ele obstrui a visão e todos os outros sentidos. A pessoa quer porque quer ter alguém para chamar de seu. E, diante da pressão de encontrá-lo, despejam-se sobre qualquer alma as suas vontades e planos, sem respeitar a si próprio, sem considerar o outro. Perde-se o critério de avaliação de sentimentos, de compatibilidade, as sensações se confundem e se misturam umas às outras.

Dessa forma, é dada a largada aos amores de fast food. Esfomeados em busca de uma embalagem bonita, alguém que lhes salte os olhos e sacie a fome de amar e ser amado naquele instante. Tem que ser agora, deve ser pra já. A sede matada na saliva, e o coração que morra afogado nas lágrimas do dia seguinte. Sim, porque depois de tantas trocas, tornam-se mais estranhos do que antes de terem sido apresentados.

Corações deveriam ser alvos de amor pra se lançar sonhos a dois, cumplicidade, tantas coisas boas, e não um pano de chão para que qualquer um limpe os pés na entrada e pise na saída.

Na pressa por viver um amor e em busca de ser feliz junto a alguém, as pessoas se atropelam em euforias, bocas e corpos. Não estou dizendo que se deva ser um monge e viver recluso às possibilidades amorosas. Não é isso. Aliás, eu — como parte do time dos corredores pela vida — penso que estamos aqui para viver de forma ampla, trocar experiências, ser feliz e fazer feliz. Mas acredito, sinceramente, que o coração não é um brinquedo, nem objeto de tortura, muito menos algo perecível com prazo de validade para se usar e descartar. Aliás, nas questões do amor, deve-se ter cautela para que ninguém saia, pelo menos, tão ferido.

Está praticamente imposto que trouxa é aquele que preserva o seu coração, que se ama e se respeita acima de tudo. Porque legal mesmo é sair traçando tudo o que se vê pela frente, deixando fluídos por aqui e acolá, espalhando sementes em terras úmidas, sem a menor precaução e preocupação com o terreno alheio. Não se engane. A fome desvairada por provar todos os quitutes da festa passa, e o vazio que fica é um buraco tão fundo e tão escuro que vai desencadear meses de insônia e muito, mas muito arrependimento por ter sido tão permissivo.

Portanto, antes que nos deixemos tomar pela ansiedade de degustar os amores de fast food, por que não nos alimentamos, antes de tudo, de amor próprio, de confiança, de respeito? Que nos amemos primeiro e nos provemos primeiro antes de oferecer um bocado a qualquer morto de fome.

Se o amor não tem limite, que a caridade amorosa tenha.